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Tuesday, November 02, 2004

Educação Light

A educação é um fardo que carregamos, sempre que viramos as costas e tentamos perspectivar o nosso passado. Ela atinge-nos com uma violência cruel, bate-nos sem avisar, trespassa-nos para morrer-mos dentro dela. Ela é limitativa. Ela pode ser vantajosa e dar-nos a conhecer um cem número de mundos novos, onde nos tratarão por epítetos ternos e renovadores, mas também pode ser uma condicionante para a vida póstuma. Pode criar barreiras e memórias das quais muito difícilmente se conseguem apagar. Ela e todos factores que dependem dela são parte do que nós somos hoje, e a ela lhe devemos muito.
A verdade, é que a educação é um bem negligenciado na nossa sociedade.
Onde outrora existia uma sociedade vítima das suas próprias repressões morais e éticas, encontrámos uma educação moderna, onde assenta o princípio light. Ou seja, onde outrora havia repressão, hoje existe omissão. Omissão de quê? Omissão de valores, respeito e comportamentos morais. Decide-se por uma educação onde o tudo póde traumatizar a criança, onde nada deve aborrecê-la, onde nada deve ser impedido. Elas têm o mundo a seus pés. Um mundo de ilusões e espanto cor de rosa, ou então azul como o céu na Primavera que nunca mais acaba. Crescem num mundo irritado, rodeadas por adultos irritados repletos de certezas, porque disso e só disso vive esse mundo. Ser adulto consiste basicamente em não pôr nada em causa, em salvar a realidade conhecida e não mais sonhar, nunca mais.
O problema da educação reside desde logo num ensino precário. Onde antes existia um ensino com base na separação de sexos, onde os melhores alunos ficavam numa parte distanciada dos outros e onde a régua fazia parte da dia-a-dia de cada um de nós, é estranho ver como hoje tudo está diferente. Os professores, como que gafanhotos, procuram ao máximo encontrar uma escola onde possam permanecer o máximo de tempo possível, tentando ensinar, quando na maior parte das vezes nunca souberam aprender. Nunca aprenderam a ler, a sentir o gosto de folhear um livro, de o percorrer e senti-lo. Talvez desconcertar um poema de António Aleixo ou uma crónica de António Lobo Antunes, mas não. Talvez um resumo de Eça, talvez um resumo de Agustina, se ao menos isso.
Um professor tem esse fardo de passar o conhecimento, mais do que isso, passá-lo de uma forma apaixonada para que os alunos se apaixonem por ela. Mostrar que Sophia é magnífica, que Lídia Jorge é das escritoras mais importantes da actualidade e que Eugénio de Andrade é mais do que aqueles poemas publicados no Metro do Porto. Mas o problema do professor começa quando não tem vocação e por isso não aceita candidatar-se para essas paragens caóticas e suburbanas. Só poderemos ser melhor, se nos dedicar-mos a isso de raíz, enfrentando o problema, cortando os salários milionários dos gestores públicos e dos acessores, fazendo com que o mundo pare de andar ao contrário. Esta falta de equilíbrio condiciona todo o nosso modelo de sociedade como é vista hoje.
O ensino e a educação devem ser aliadas e não uma forma de ilibarem a outra. A culpa não é dos pais que não educam os filhos, nem dos professores que não tomam as devidas precauções. É uma culpa conjunta. Estes dois factores não podem ser vistos como repressões morais ou portadores de uma liberdade libidinosa. Está na hora de se encontrar um equilíbrio certeiro entre estes dois modos. É urgente de facto. No caso da escola, o caminho está cada vez mais a ser regido por uma estrada que conduz à ignorância. Os manuais e mais uma vez a omissão de certos cantos do Lusíadas é prova mais que bastante para encerrar o meu argumento.
Eu não tive a educação que idealizo para os meus filhos. A liberdade e a disciplina devem andar de mãos dadas. Ser pai é mais do que um papel, é uma missão, é um lema de vida, é uma paixão. Assim deveria ser encarado o ensino, como uma paixão, mais do que uma vocação. Deveriam ser feitas provas anuais aos professores para determinar o grau de capacidades, deviam ser fixados os professores numa escola, para acabar a dança anual que se revelou catastrófica este ano, para que a confiança que os alunos adquirem ao longo de um ano, não tenha de ser conquistada todos os anos, por pessoas novas.
A educação nos dias que correm aposta no prazer momentâneo, onde tudo foi feito para algum fim, onde as crianças são educadas por um televisor que espreitam horas infindáveis diariamente. Um pai não póde ver na escola uma forma de cumprirem com o seu papel, nem a escola de se desculpabilizar da sua má função. São passados de ano alunos que não reúnem as condições mínimas. Nesta vida light, onde tudo é oferecido, os alunos ficam cada vez mais com a impressão que tudo é fácil, tudo é alguma coisa. E daí mergulhámos no espírito consumista da nossa juventude que desagua num aumento da criminalidade nos jovens, condicionado por uma forte desmotivação de professores mal remunerados e pais que correm para pagar a conta da luz, sem nunca perceberem que o puto lá em casa já usa preservativos e tem certezas como gente grande. Vamo-nos deixar de certezas e de radicalismos. O equilíbrio é a única fuga para uma sociedade puramente civilizada. O light já era.