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Monday, December 11, 2006

Orgia Comportamental

Como se perdurasse em mim essa grandeza de não compreender o que a realidade me anuncia. Para essa leviandade não tenho mais solução de desejar o certo, sabendo que não é a impotência consuladora que me fará elevar ainda mais esse grito contido.
Então, deleito-me nessa emoção estrangeira que é não pertencer a lugar algum, de me deixar levar pelas náuseas constantes daqueles que por mim passam, do pedido encarecido, do primeiro toque e por fim, sempre no fim, a consulução dos corpos, quando já só há prazer.
Ainda há sentido para correr, na esperança que me persigas, que me faças flutuar, em que o amanhã voltará a ser o meu, quando poderia ser o nosso. Não compreendo de facto esta desnecessária tortura intelectual, em que revejo todas as causas prováveis, em que me transponho e me projecto para fora deste corpo que me pertence a maior parte das vezes, para que a reflexão possa ser menos parcial.

“A mim, só me falto eu”, foi o que eu repeti ao som daquelas palavras. Eu ali, rodeado de todas aquelas pessoas, à procura de alguém que sentisse a verdadeira busca pela incerteza do perdão, a conquista da vontade, a entrega irracional. Invariavelmente, toda a gente mantinha o olhar prostrado no palco. Era a banda sonora de todos aqueles que ali estavam, porque afinal todos nos sentíamos sós, como ela.
Ela era a materialização das nossas fraquezas, do dó que tínhamos e sentíamos por cada um de nós, no contraste que era ver-nos ao espelho e odiarmos o mundo que nos pedia um pouco mais. Havia pessoas que não a olhavam, que se mantinham intactas, conscientes de que o silêncio não existia, mas ela continuava, com o “coração cansado”, dizia.
Era algo parecido que sentia, nessa orgia comportamental, em que partilhávamos a graça de não nos contermos nesse egoísmo que era guardarmos tudo aquilo que bate cá dentro, para a nossa consciência. Esse altruísmo de quem não compreende nada de tecnologia, mas acha-se com a capacidade plena para ser livre e independente.
A filosofia, entendi ali, deixou de interessar e Hipócrates é que tinha razão. Por isso abandonei aquele coliseu, obra cultural máxima, de uma cidade cada vez mais empobrecida intelectualmente por patrimónios privados e deixei-me estar. As montras eram tudo aquilo que eu queria observar : a realidade intacta, a realidade estática, a venda da matéria, ao invés da procura da alma.
Não entrei em lado algum. Conduzi-me pela rua que já fora minha. Ainda ouvi alguém a sussurrar “só o teu amor é tão real”, mas eu já tinha ouvido democraticamente todos os valores e conceitos que queria introduzir, todos os esquemas contidos nessas palavras que eu sempre quisera sentir. Fora por elas que me havia perdido, nesse chão que acabou por ser meu, cada vez que não encontrei aquilo que me haviam prometido. A adolescência tem de ser mais do que isto no final, alguém me disse. Entre um brandy e um gin, tudo se diz, de facto. Mas se foram essas as palavras que sempre me guiaram, deviam ser essas também, aquelas que me salvariam.
Nesse momento de intrépida conclusão lembrei-me de sorrir, apenas porque devia. A nobreza de se ser alguém consiste em sorrir e tirar o partido da realidade que nos convida a viver e ultrapassar aquela que nos faz querer morrer. Pensei que o significado para a impotência e a frustração tinham mais do que ver com um gira-discos, do que com um método interiormente alimentado dentro de mim. Conscientemente, tudo há de voltar ao que era. Não existem explicações forçadas, apenas hipótese experienciada.