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Wednesday, September 19, 2007

Graça


O difícil há-de ser sempre conseguir prolongar a perfeição irreversível do momento espontâneo e nunca planeado.
O impossível há-de ser o de não recordar com uma alegria exasperante todos aqueles momentos que nos pareceram de uma partilha única e que nos pedem uma reflexão quase exaustiva à estranha forma como de vez em quando, conduzimos a nossa vida.
Não concebo a leveza pela qual a vida segue e toma as suas formas, umas vezes mais compreensíveis do que outras. No fim, tudo há-de ter algum significado que vá de encontro às nossas expectativas e àquilo que lentamente nos tornamos.
Sermos capazes de gritar que fazemos aquilo que acreditamos como correcto e politicamente bem orientado, nem sempre nos chega. É preciso libertar essa angustia que nos limita e nos cobra, diariamente, os juros por não termos tido a coragem para discernir qual seria a melhor opção para aquilo que todos temos como finalidade.
Não será preciso descrever a seriedade do assunto, a magnitude do riso esboçado cada vez que agarro as memórias e penso que já tive tudo e que persegui uma nova direcção para a qual, percebo agora, talvez não ter créditos suficientes para dar uma continuidade sustentável.
Se vivo a correr, se vivo para correr e sei que o fim será certo e preciso, é irracional continuar um trajecto esgotado por si próprio. Devia notar, por mim próprio, que tudo terá uma altura certa para ter lugar, que não há pressa sem haver base sustentável que se conclua em futuro e que muito menos, há materialização que nos afaste da solidão.
Damos tudo por um sonho para acabar com outro e eu que já não tenho idade para inicia-los nem tão pouco para os ver morrer e muito menos com quem os partilhar.
É o início da era racional, onde a vida adulta parece dominar estridentemente, onde há prazos e impressões digitais que nos identificam mais, do que as nossas vitórias.
Por isso mesmo, perdi a capacidade de chorar por mim e pela frustração em que estou enfiado e talvez por isso dê tanta relevância àqueles minutos em que vos segurei na mão e tive a certeza que ainda não estava morto, e quede facto, ainda poderá ser o sonho que comanda a minha vida e que é nessa falsa esperança que reside toda a minha graça.
Foi nesse momento, como em tantos outros, que longe de casa, me senti mais próximo de quem realmente sou e de quem realmente quero ser. O prolongamento da inocência poderá nunca ter acabado e talvez por isso, eu possa continuar a ser quem nunca deixei de querer ser.
De facto, a coragem para deixar de sorrir e ser educado, como sempre me ensinaram, não a tenho. Sou católico e por isso mesmo vivo por entre o prazer da culpa das minhas acções e por isso mesmo, hei-de sempre tentar fugir ao prazer, por saber antever a única consequência que isso poderá ter.
Não fui à espera de me encontrar, porque essa verdade tenho-a em mim de uma forma muito clara. Não fui à espera de me perder no tempo de uma forma tão pura, nem sequer de conseguir viver de uma forma tão livre. Mas o que trouxe, foi a noção clara de que as mãos que me agarraram e me fizeram chorar, são de facto importantes demais para serem deixadas para trás e que talvez tenha sido por isso que ainda não parti.
A justificação há-de ter sempre um nome. Neste caso, serão sempre vários.



Listen to : John Mayer – waiting on the world to change