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Wednesday, November 23, 2005

Visão

A minha inspiração és tu. A minha ferida enrolada em carne viva, a minha experiência conseguida e arrancada do fundo da minha dor dormente. Fiz-te assim à minha imaginação, partilhei vidas e construí domingos solitários com alguém ao meu lado, porque sempre soube que chegarias e me reconciliarias comigo próprio. Quero esquecer a tua inactividade que tantas vezes me frustrou e concentrar-me no telefone que teima em não tocar, a fim de ouvir a tua voz que sempre me chamou.Falta-nos sempre coragem para alcançar o que sempre queremos. Deixamo-nos estar nessa forma inerte e pesada que é a nossa diária preguiça mental para nos esquecermos que podemos também ser felizes.Corri sempre na tua direcção e nunca te encontrei. Inventei amores que não se sentiam, paixões que não colidiam. Entreguei-me também eu nessa força que é a plenitude de não se viver. Procurei-te na noite e na música que me ensurdecia esperando sempre essa casualidade que me havia de matar, já eu sabia. Estiveste ali a um alcance da minha perspectiva, da minha oblíqua visão, e eu perdido nessa graça que é não compreender como se acorda, não pressenti que tudo poderia ter acabado ali.Foram tantas as palavras que proferi sempre, antes de me deitar na esperança do alcance dessas mãos que haveriam de ser minhas; poderia ter evitado tanto se o meu pedantismo não fosse reconhecível aos meus olhos…Qualquer coisa como fazeres parte de mim.Falta-me tempo, falta-me o dia que se rompe demasiadamente cedo, falta-me essa inutilidade que me corrompeu. Inventei tanto sobre ti, escrevi tanto sobre ti, que quando acabei por te notar, simplesmente não estavas lá. Não estavas comigo.Por isso atiro-te com essa almofada cheia de pena(s) para que percebas, mas para que não te magoes também, que o que sinto é um fardo inexplicável, que a fragilidade da dependência nunca me seduziu, que as tuas calças de ganga sempre me pareceram um pouco justas de mais.Não sei já, se te disse demasiadas vezes que espero o reencontro com o perfume que nunca usas. Tocar-te nem que seja por um ínfimo minuto, o mais longo da minha vida. Quis sempre tanto sentir o que sinto e partilhá-lo com alguém que agora que chega esse solene momento, me sinto derradeiramente pequeno demais para o conseguir fazer. Que as palavras não sejam precisas, que o silêncio seja apreciado juntamente com a combinação das nossas feridas que hão-de crescer para nos atormentar, sempre.Sinto-me um fantasma, por entre esta cegueira permanente.“Amo-te como se não houvesse amanhã”."

(…) Ghosts have just as good a right In every way, to fear the light, As Men to fear the dark."Lewis Carrol