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Tuesday, January 13, 2009

Não sei por onde vou, só sei que vou contigo

Tudo é determinantemente vago. Vivémos em pequenas conquistas, refeitas dos sonhos que inevitavelmente acabam por secumbir à energia que desaparece diariamente.
O porquê de muitas vezes nos levantarmos do espaço que nos parece tão acolhedor quando tentamos despertar, é algo de incompreensível e irracional.
Se formos seguindo este raciocínio, vamos concluir que somos e estamos presos a uma realidade, a uma vida, a uma cama ( no meu caso a uma escrita) completamente automatizada. Crescemos porque nos disseram que cresceriamos, amamos porque todos vemos no grande ecrã, figuras dispostas, em fila, a amarem-se a e a morrerem juntas.
A passearem nas ruas de N.York depois de uma suicídio em massa, ao qual escaparam, possuídas de uma força inesperada qualquer. Nunca saberemos.

Hoje obriguei-me a não apagar a primeira linha. Normalmente é isso que faço. Escrevo um parágrafo inteiro, leio e apago. É automatizado. No início, porque não gostava das primeiras palavras que acabavam por aparecer, agora apenas porque me fiz pouco mais do que inocência perdida diante de todos.
E eu nunca gosto, de qualquer das maneiras.
E quando não apago, acabo por me perder neste emaranhado de palavras e citações feitas por alguém, nalgum livro que não foi escrito por mim. Nunca será.
Se me virar, ainda consigo ouvir todos aqueles que se levantam de manhã e não percebem porquê. Não há doçura na vida, para aqueles que não percebem o porquê de todas as coisas que acontecem, acontecerem de facto.
Para aqueles que amarguram perantes as muitas ou poucas (nunca saberemos), viscitudes de uma vida pouco ou mais ao menos normal. Para aqueles que entram num autocarro, perante 7 graus negativos e esperam carinhosamente que a noite chegue depressa e os volte a adormecer e o tempo passa, diante de um cigarro que teima em desaparecer depressa demais, para alguém se conseguir esquecer verdadeiramente do cartão que expirou a validade há muito tempo, ou o crédito bancário que avança perigosamente ou um qualquer namorado que trai, indubitavelmente, como ( quase) todos os homens. Ou mulheres. Humanos.
Na rádio, perguntam-me muitas vezes se somos humanos ou outra coisa qualquer.
Eu, com o tempo, faminto que fui, deixei de sentir gradualmente interesse pela espécie com quem tenho que fazer as minhas acções diárias. Ninguém atura ninguém, ninguém quer saber realmente de alguém, apenas daqueles que amamos. E como não fomos feitos para amar, não sabemos porquê nem como.
São tantos os pensamentos que ocorrem a quem de manhã entra no autocarro, que é impossível que alguma daquelas pessoas imagine sequer o que é ser feliz. E ninguém quer saber.
Temos donas de casa a quem ninguém dá o devido valor, reformados que foram esquecidos pela família, estudantes que nunca terão emprego, professoras que não têm dinheiro para abastecer o automóvel outrora de luxo, o operador do apoio ao cliente da vodafone que ouve tantos insultos quanto feijões come ao almoço, misturado com o arroz ( que tá caro e escasseia – perguntem aos chineses que eu não como hidratos de carbono), o funcionário da Câmara que nunca chegará a ser efectivo ou o advogado em início/fim de carreira que por não querer/saber mentir, nunca chegará/cehgou a lado nenhum.
Entre tudo isto, existo eu. Sentado nesse mesmo autocarro, como sempre, sem destino ou direcção. Entro e saio quando e porque me apetece. Falo com quem quero e tento sair nas paragens certas, aquelas que me mostrarão algo de novo, algo de verdadeiro. No fim, a viagem é sempre igual.
Enquanto isso, há um lugar vazio ao meu lado, como sempre houve. A única diferença é que está reservado e eu finalmente sei para quem é e estou feliz com isso.
“Não sei por onde vou, só sei que não vou por aí”
( e eu não apago nada do que escrevo hoje, por isso tenho de ter cuidado, é algo que se adquire com a idade - a perda da vontade em agradar a todos).
Eu só sei que vou contigo. E as pessoas que ocupam o autocarro também o sabem e consentem, ficam felizes, algumas reticentes outras enciumadas, mas todas felizes de alguma maneira. Afinal, o que se leva daqui, não é o plasma comprado no Continente em saldos, mas uma história, a nossa história.
Mesmo que não quisesse, mesmo que não pudesse, chegou a hora e o tempo de criar uma história que englobe o rasgo de um sorriso que me ensine a amar, verdadeiramente.Mesmo que não estejamos preparados para amar, mesmo que isso não seja suposto. Lá porque é assim ou foi assim, não quer dizer que tenha de ser, realmente.
Enquanto te sentas, reparo na tua estatura, no teu nariz, na tua boca, na tua alma, na tua inocência. Nunca tive nada que quisesse verdadeiramente, até te encontrar e saber que te sentaste ao meu lado porque querias fazer o resto da viagem comigo, seja lá para onde ela for.
Seja como for, passei a amar-te a partir do primeiro dia em que te vi a entrar no autocarro, de chave perdida abraçada a outro alguém que um dia haveria de ser eu, apenas porque a chave estava comigo.
Perdi-me a encarar-te, a ver como me fugias e agora que ficas ao meu lado, nem sei como não tentar alterar a realidade à minha volta. Tenho que agir, para encontrar as melhores paragens, a melhor paisagem, a melhor conversa para que te deixes encantar e nunca queiras acordar.
E eu não sou perfeito, é um problema, na maioria das vezes. Encarar alguém que foi e é moldada numa forma mais convencional, mas menos quebrada do que a minha, sem tantas metáforas, sem tanto surrealismo, apenas um pouco mais normal.
Sem interrupções de sono durante a noite, sem medo que atrás da porta estivesse não o papão, mas algo bem parecido e mais real. Alguém que me mostrasse o que realmente interessa, por detrás desse arco repleto de cores que muitas vezes não vejo, a não ser contigo.
Não interessa o que não posso oferecer. Jantares em locais exóticos, concentração absoluta em ti, apenas porque as pessoas que vão no autocarro comigo, contam com a minha presença até ao fim, ou palavras carinhosas até ao anoitecer.
Sei apenas que estarei contigo, até ao fim da viagem, seja ela qual for.
Não sei por onde vou. Só sei que vou contigo.


Best Friend José Régio.