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Monday, January 23, 2006

Realidade

Esta é a música preferencialmente entoada, facilmente esquecida, repleta de erros imperceptíveis a qualquer passagem que não alcance a verdadeira beleza sensorial da imagem em movimento. Contei-te e conto a minha vida, como quem conta um romance, onde a tua beleza me ofusca e me arranca toda a energia que encontro, a fim de poder compartilhar este conhecimento que é oferecer-me a algo tão grandioso como tu.
Tenho ainda de me deixar levar, como no início, por essa força transladada muitas vezes para uma timidez coerente e socialmente aceite. Fiz o que podia para parar com este movimento, no qual te foco e te retiro, onde me complemento em tudo aquilo que és, por entre os cheiros e por entre esta vontade de não te deixar ir, de não largar tua mão, como quem larga uma nota que se desloca pela profundidade que é ter a certeza que realmente te tenho aqui por dentro, onde ninguém nunca chegou a ser aquilo que sempre tentaram ser.Esta desintegração, esta redução do próprio “eu”, esta argola presa nestas memórias sempre um pouco perdidas.

Nesta roda gigantenão permaneço mais.
A inconsciência desapareceu, porque afinal
O problema nunca me pertenceu


È escusado perceber porque é que a minha fragilidade foi a escolhida para suportar esse sorriso que nunca me mentiu. Vi tanto e fugi a tanto, tornei-me portador da vontade de querer, mas nunca de ter, de saber que independentemente do que dissermos, as pessoas têm todos os mesmo sonhos e que por isso mesmo, partilham salvo raras excepções, as mesmas raízes, as mesmas bases e muitas vezes do mesmo sorriso.
E por isso tentei fugir, correr sem destino ou direcção, sem cor e sem brilho, quando percebi que nunca te voltaria a encontrar nessa predisposição directa e subjacente, nesse entoar de códigos metafísicos que não me deixam dormir, nesse recolhimento que é o de me deixar levar por tudo aquilo que o meu próprio sonho fez de mim, essa participação sem final que se avizinhe, sem tradição aparente, sem leveza transcendente, sem emoção pretendida que se irá desvanecer quando nunca mais tiver de imaginar que és tu que me carregas.
È este sentido sem início, essa notícia de que as calças que carregas formam a tua pele, que me escutas por entre horas a fim, precisamente por conheceres a cristandade comunicativa que habita em mim, não porque eu queira, apenas porque eu preciso. Preciso de ti e do teu sinal, da tua mágoa e da culpa que me fazes encontrar e que me ajuda a subsistir.
É o preço da racionalização, da mentalização que ser o que se é, ainda é pouco; que nada que tocamos pode ser suficientemente narrável, que nunca ninguém é transparente porque o deseja e talvez por isso me custe a acreditar que não tenha corrido o suficiente, que fui apanhado e não vejo outro encontro que me faça soltar, outra criatividade audível, outra melodia que me carregue tanto.
És a realidade que eu nunca imaginei ser real.

"Just bring me along
cause i got to see what you have to offer me"

Wednesday, January 18, 2006

22/01/2006

Existem pessoas que muito para além de se destacarem, criam sensações e tumultuam de uma maneira amplificadora a nossa perspectiva de certos e determinados aspectos. Manuel Alegre, por ter conseguido ser uma personagem reconciliadora nesse tão fumarento mundo político, onde se travam lutas sempre por debaixo da mesa, merece o meu profundo crédito.

Chamem-lhe escritor, poeta, revolucionário, ou simplesmente político, mas tudo acabará por ser impreciso. Afinal, o que pretende um candidato a Presidente da República quando faz valer o vocalista dos Da Weasel como Mandatário para a Juventude? É irrefutável que as ideologias e ideias de Manuel Alegre sempre caíram mal, mesmo dentro do seu partido, que sempre foi visto com algum desmerecimento por honrar e nunca adulterar valores mui nobres como o da amizade. Sejamos ou não de esquerda, Manuel Alegre é o único candidato capaz de retomar o passo a este andamento burocrático a que o país se submete diariamente e o único capaz de fazer frente aos fundadores da democracia e das suas bases que vigoram agora em Portugal.
Cavaco Silva e Mário Soares não fazem mais do que retomar os seus postos, as velhas guardas, a velha glória do povo ignorante que ainda não perguntou a Cavaco Silva para onde foram os milhares de contos que entraram aquando a sua tomada de posse como Primeiro-Ministro ou a Mário Soares que sempre foi um combatente do regime fascista, mas salvo raras vezes, do outro lado do mundo, sem que por isso tivesse experiênciado os verdadeiros tormentos que tanto diz ser contra.
Dia 22 – se não estou em erro – temos todos um pouco a oportunidade de dar um pequeno abanão neste cada vez mais inglorioso país e expulsar qualquer convicção de que quem cimentou as bases para tanta crise, volte com as suas velhas ideias a ver a Praça da Alegria num asilo de luxo qualquer. Talvez este exemplo se indique mais a Mário Soares, que de tão velho e senil que está, acabou por se esquecer quem foi o sempre amigo que lhe prestou apoio nas mais variadíssimas formas e acções.

Por último, é de registar que Manuel Alegre, para além de pessoa culta e informada dos valores vigentes europeus, associou-se a caras novas da cultura, da música e da literatura, numa busca por uma nova forma de governar Portugal, enfim o que precisamos. E vamos lá esquecer o “populismo” de Louçã.O senhor sabe evidentemente falar, mas nunca conseguirá mais do que fidelizar votos.

Friday, January 13, 2006

13

É então que me deito sem saber para onde vou, estirado, esgotado desta luta contra um relógio nunca acertado, por um tempo que se contradiz apenas porque não é pequeno, por este desejo imenso de alcançar a tua imagem, sem nunca te tocar.

Verdade é, que sempre gostei de algodão doce e por isso, tentei sempre caminhar entre a ilusão de que nunca amaria por completo e a repetição desses sabores tantas vezes facilmente identificáveis, que me arranham os sentidos e me deixam um pouco mais do que moribundo.
É esta a alegria de viver, por entre todas as marcas que sofro sem serem minhas, apenas porque sinto os sentimentos indefinidos, de uma forma ampliada que acabam por demonstrar o quão frágil posso ainda ser, mesmo quando permaneces ao meu lado. Levava-te para essa terra do nunca - onde o nunca seria o sempre - eternizando-nos nesse longo e vasto campo de sentidos, por entre os meses que quase desconfiei que tivesses esquecido.


Por isso, fecho os olhos na esperança que tudo se desvaneça, que estes sonhos, de não ter simplesmente, se criem na realidade, que utilizes o pensamento sempre como arma e que ao contrário de toda esta sociedade, não te deixes conformar pelo insurrecto e pouco palpável, porque as minhas palavras já foram gastas e polidas demasiadas vezes e o cansaço nunca vem só.


Imagino viagens tridimensionais, canais que nos hão-de levar a esse desconhecido que são as tuas acções, imitações de algo que reviste e nunca mais pudeste esquecer. Que te prefiro odiar, com sensatez, muitas das vezes, porque me sinto pequeno demais para arcar com tanta plenitude de sinceridade, porque sempre vive da argumentação fustigada e da desconfiança presente, e que só assim sei ser forte e conciso. Sem ti, nunca haveria de ter escrito as páginas deste jornal pouco mais do que íntimo sobre a verdadeira consciência que tenho da condição que agora assumo.
A paixão não é um estado que me faça corroer o interior, é antes esta grande trama elaborada pela minha necessidade de sentir a culpa interiormente, nesta cilada por mim feita, sempre que me sinto longe de ti. E de vez em quando, abano-te e fico a escutar, para onde foram todas as palavras que depositei em t, quando sei de antemão que simplesmente não estão lá. Acredito no que posso, nos objectos que não gosto de possuir, neste trajecto por mim enlaçado, nesses teus braços que me concretizam e me fazem acreditar na minha paranóica forma de estar.

Acredito em ti e acredito neste número que se faz à nossa imagem, do azar que foi nunca termos tido a coragem para nos agarrarmos antes.
Estou, secretamente, a contar todos os dias.

You were right
And i don´t wanna be here
If you gonna be there…
I wanna travel trough time
See your surprise
Hold you so tight
I´m counting down the days

Wednesday, January 11, 2006

Negação II

Não me estraguem a concentração, não me digam que o jogo de luzes que evoca a solidão é falso. Não me digam que não posso sobreviver da desilusão, não queiram colocar a dor como pano de fundo para a minha destreza emocional. O que faço é conseguir, tentar alcançar esse objecto sem cor ou roupa, esse lamentar sincero e promíscuo, essa gota sexual que escorre pelo umbigo e só pára no lençol onde eu nunca me deitei contigo.
Queria assim, por entre todos estes tecidos feitos para nos prenderem a situações nunca pretendidas, manter a minha invencibilidade, sem que por isso tenha de ser chamado de frio ou egoísta. É que o meu piano deixou de tocar, desde que não te encontrei mais, quando dizer adeus nunca foi o meu desejo. Não. Digam-me apenas que a lâmpada fundiu, mas que a esperança de que regresses novamente por entre o “meu olhar que só sorri quando te vê”, é tudo menos falsidade herege. Faz-me crer que tudo em ti é reluzente, que o passado é fantasia que arde quando me deixo ocultar por esses genes que transporto em mim e que sempre me hão-de desfazer em menos de pó e camurça.
És o nada que nunca se há-de transformar em manhã negra ou enfadonha, porque o silêncio do teu reflexo é magia constante para os meus ouvidos. Nunca consegui que me travassem neste sintoma perplexo, nesta correria abusada, neste paladar nauseabundo. Não, não me digam que nunca hei-de chegar a alcançar essa força que eu (minto?) juro que permanece escondida em ti e da qual eu denoto breves resquícios quando te abano violentamente e te faço sair desse estado de latência do qual vives e sobrevives. Não me digam sequer que me tornei abjecto, como tantas outras coisas que odeio. Acabarei sempre por eternizar a canção nunca antes entoada.
Farei assim minha e de quem quiser, a sombra que foi deixada para trás, essa rodada de uísque que nunca haveremos de beber os dois, completamente juntos, como se lá fora a neve não fosse branca.
Aqui e agora, a neve é sempre branca do outro lado, neste manto de inspiração que me sufoca e me faz descrer que o não foi apenas o que pronunciaste apenas para eu nunca largar a minha ilusão enegrecida, cada vez mais.
Devo dizer, que foram raras as vezes em que desisti, por isso não mo peçam para o fazer, porque a concretização da incompreensão é algo presente em mim, essa forma de “amar o amor” como diria Agostinho da Silva, essa recriação do meu sonho personalizado em ti. Eu que me tornei discípulo da irmandade dos amantes da paixão e quase da tesão, eu que fui cego, mas sempre alcançando a batota no jogo, eu que nunca fui surdo e que por isso abandonei sempre quem quis. Que não me digam, que não me escutem, que não me leiam. O não é apenas uma parte da minha comiseração de fugir ao que realmente encontro em cada espelho. Não. Amar não acaba.

Friday, January 06, 2006

Irresponsabilidade

Conseguido o portento de me manter ao teu lado, entre um número que não condiz com a sorte de te ter, nem preconiza uma vastidão de certezas inalienáveis, que me conduzem, sem que disso suspeite a um afogamento nessa tua beleza inalterável. Banalidade boçal que me fantasia e faz com que derrape nessa tua melodia, entoada num grego como nunca antes reconheci, nesse teu chão concebido só para me aquecer, numa cama qualquer. Poderia dizer-te que o vazio sentido é algo que não realizo mais. A justificação ficou encarregue de levar o futuro com ela e fiquei apenas com a areia que me trouxeste, quando entraste e nunca mais saís-te. Faço-me assim, à luz do que me tornei, sem que por isso permaneça no local onde não te encontrei. Acabei por te esperar como sempre quis. Lamentavelmente, tudo deu certo de mais e o meu pessimismo diagnosticado em várias cirurgias anteriores, concedidas por enfermidades que só por algum acaso de sorte não me levaram, fez com que eu sentisse apenas a tua leveza castanha, por onde me perco sem conseguir alcançar o fim de tanta magnitude. Volto com tudo o que tenho, carregado de presentes que nunca quis oferecer, com cadeiras que acabaram por ficar sozinhas, com palavras que nunca poderão ser ditas. Lutei por ti, como quem luta pela liberdade, sem saber na minha cumplicidade íntima de ser eu quem sou, que nunca mais te conseguiria largar, fazer-te desaparecer, como tantas vezes me foi possível. Sabia eu, ou então achava que sabia, na minha tola presunção, que seguirias outro caminho que não o da entrega, acabando por irresponsavelmente, me esquecer da tecnologia viciante que é o amor. Sim, és tu a senhoria revoltante na procura de um sentido profundo. Esta poesia cantada, esta dramaturgia inalcançável, essa beleza que duvido que venha a ser mim. “Alcançar o fim, Para sempre contigo” Por isso pego em ti, neste sentir agonizante, sem saber o que fazer, na mágoa que é falhar sem se perceber porquê, numa descrição de um poder que nunca foi meu. Se os olhares de outro alguém importassem, se as mãos que me agarram contra a minha fúnebre vontade me levassem, se este texto que escrevo fosse a mentira de quem sou, então seria tudo mais fácil. É uma irresponsabilidade infantil pensar que nunca serias tudo o que eu quero Mandalay_Beautiful

Wednesday, January 04, 2006

Fingimento Enrolado

Sei perfeitamente que este lugar de onde vim nunca mais vai acabar. Esta melancolia trespassada e sentimental de quem não aguenta esse jogo viciado. Não entendo e não concebo porque nos sujeitamos tanto a essa arte de persuasão e de engano fútil, dessa máscara que preferimos usar, ao invés de tentarmos ser aquilo que queremos. Tentamos todos decidir pelos outros todas aquelas coisas que nunca fomos capazes de escrever. Falta-nos a coragem para parar a fim de começar algo de novo.
Parar o sentimentalismo desafinado, um sorriso pegado e influenciado, essa piada que se forma na nossa boca como espuma cheia de falta de personalidade, parar com esse fingimento sem retorno, com essa procura pela sombra que nos foge, por esse olhar pequeno que de vez em quando possuímos a fim de começar com a verdade que não tem necessariamente de fazer ninguém sofrer, de nos rirmos colados ao chão, mesmo que os nossos dentes não façam de nós aquilo que vemos na televisão antes de nos deitarmos.
Estou cansado, no fundo, desta graça que se forma, deste aperto de mão cómodo, dessa vida monótona e pardacenta, de me sentar no sofá e constatar que são poucos aqueles que trabalham e muito menos aqueles que apontam soluções.
O país está completamente partido, estagnado, envolto em fantasmas que o transformaram neste pequeno paraíso fiscal e que retornam agora - como se de alzeimer sofressem - para nos voltarem a atormentar, alimentando essa tristeza passiva e democrática em que vivemos. Este fingimento que partilhámos agora mais do que nunca, apenas porque se torna num hábito, numa ordenação contínua, nessa necessidade de catalogar todos os objectos encontrados nesse sonho sem fim. Construímos uma mesa farta e cheia de fraternidade, para no dia seguinte passearmos juntamente com as nossas mágoas e voltarmos ao que somos. Fingimos que somos, que gostamos e muitas das vezes somos apenas isso.
Preguiça mental, falta de objectividade, falta de serões junto ao por do sol magnífico que poucos hão-de aprender a gostar. Fazemos o que podemos e fazemos ainda tão pouco…somos parte do que criticamos, sempre à espera de que alguém com o nível de vergonha mais baixo, se exponha, apenas para que nos possamos rir também e pertencer a esse pequeno núcleo de sobreviventes por via dessa técnica, desse homicídio anunciado.
Somos o mais desonestos possíveis, não suportamos as diferenças de ninguém, não concluímos um único pensamento, somos cansados pela nossa lenta emoção de percebermos que nunca haveremos de poder ser aquilo que outros já foram e por isso mesmo tornamo-nos desistentes dessa longa caminhada.
Falo por mim, por esta trama a que chamamos Natal e que cada vez mais me enfastia e me torna desprezível aos olhos de quem me acompanha. Falo dessas palavras tão feitas de ignorância social quanto desprezo pela vida de quem nos rodeia. Falo pelo fingimento por mim observado em que me tornei cúmplice, toda a minha vida. O nosso maior medo é o de ficarmos sozinhos, sem perceber a que lugar pertencemos, para que casa devemos correr quando o sino toca, a que olhos nos devemos entregar, quando todos eles são azuis. Não sabemos nada – e falo ainda mais por mim
- quando me esqueço que existo. Entre a voz do Jack Jonhson e esse mar que não pára. Ele que espera que tudo isto seja só uma fase e que por isso se deixa enrolar, como a maior parte de nós.
A chuva que caia, lá fora. Hoje, já alguém me trouxe para casa. E logo hoje que nem sequer foi preciso fingir.

Dreams be Dreams Jack J.
28, Dezembro, 04

Thursday, December 15, 2005

AUSCHWITZ II - BIRKENAU

Apesar de ainda não possuir a grandeza para escrever o que sinto acerca dessa emoção estrangeira que habita por dentro desta entoação que é ver a destruição do mundo à minha frente, vou tentar transcender-me a fim de remeter no peso das palavras essa explicação canalizada através do meu olhar.

Faço parte deste mundo ocidental, que não raras as vezes, prefere pensar que o erro habita sempre do outro lado do mundo. Não temos tempo para nada. È tudo uma questão de escolha, de ter uma alma que se apoquenta com os pormenores do vizinho, com os horrores que se passam no piso por detrás do nosso, nas mais eternas variações da história.
Quando vemos alguém de pele escura, mergulhada nesse castanho que esperamos que no Verão seja nosso, pomo-nos atentos e desconfiados, apenas porque é sempre assim que nos querem, desconfiados, atentos e competitivos. Temos o preconceito contra toda a gente e mais agora, contra essa religião incompreendida, apenas para fazermos esquecer o quanto somos também perversos.
È essa maldade que vive em todos os seres humanos, que coabita lado a lado com as paredes e o choro de quem por lá passa. Pelos turistas que insistem em tirar fotografias, comprar poster’s para depois colocarem no quarto, onde dormem sem sequer pensarem que algo igual ao que assistiram através de imagens e objectos, se passa nesse preciso momento e com a sua inconsciente ajuda.
Somos todos culpados, uns mais do que os outros, pelo que se passa no mundo, por esta alienação constante. Se antigamente ser alemão consistia num derradeiro e eterno pecado, hoje o ser muçulmano consiste no mesmo conceito, não fosse este mundo uma estrutura de conceitos neuróticos, uma vontade irrepreensível em catalogar tudo e todos, apenas para nos sentirmos mais seguros.
Auschwitz consiste também, nessa alienação constante que é o sistema capitalista que nos cerca e abandona numa solidão angustiante. Mostram-nos imagens e desenhos, como se tudo se passasse há muito tempo. Deixam-nos andar por ali, duas eternas horas, em que vemos fotógrafos inusitados e irresponsáveis e desejosos de recontar a toda a gente que ali estiveram. Nesse mesmo local onde milhares de pessoas morreram, apenas porque lutaram pela liberdade de serem quem eram.
Auschwitz é um museu. Apenas isso. Uma memória pouco real do que se passou, em que tudo está colocado de maneira a que uma pessoa se esqueça, que chore e que respire de alívio, como se o que fosse ali representado não fosse o desmanchar desse sonho europeu em ser ideologicamente perfeito e irreal.
O pior, ainda está para chegar. O pacote turístico de que faz parte esta grande viagem onde acorrem multidões dispostas a viver um pouco daquilo que nem sonham que se viveu, contém ainda um bombom recheado de realidade e estremecimento. O campo onde tudo realmente se passou. Onde milhares de pessoas viviam, trabalhavam e morriam. Onde se pode ver as humilhantes condições em que estas pessoas acordavam, os quilómetros de habitações degradadas, as enfermarias onde eram mortas as crianças ou onde se faziam experiências médicas com as mesmas. Uma das maneiras mais usuais para se matar uma pessoa era levá-la a trabalhar sem cessar. Inevitavelmente, acabariam por morrer, estafados e cansados.
Não foi tanto o facto de poder ver o cabelo que era tirado às pessoas para depois serem tornados em colchas ou os vários métodos de tortura. Em Birkenau (Auschwitz II), o segundo campo de concentração, era uma realidade desmedida. Neste via-se a imensidão dessa tortura, um espaço que a visão não encontrava o fim, onde nada havia sido tirado do sitio, mas que em nada chocava os visitantes, não viessem estes já cansados e banhados em lágrimas do teatro que haviam visto durante duas horas.
O que me mete mais medo, são as pessoas que por lá passam e se perguntam como alguém pode ter tido a coragem para exercitar na prática um plano tão maquiavélico. São apenas vitimais do sistema neo-liberal que faz com que se esqueçam que hoje em dia, tudo se continua a passar, seja em África, seja no Egipto ou em Cuba. O que determina não é tanto a ideologia, mas antes o sentido de que não há vida para além desse mesmo pensamento castrador.E depois, continuamos ainda com essa mútua sensação do que o que ali se passou, foi algo contra os judeus, algo que nunca nos afectará a nós. E como nos enganamos!As principais vítimas foram sobretudo polacos e russos que lutaram contra a ocupação. O que ali se passou e continua a passar nos dias de hoje, foi uma luta contra os direitos e princípios humanos. Negros, deficientes, homossexuais, ciganos, franceses, ingleses, enfim, pessoas. O que importa é que eram pessoas cuja vida foi tirada, sem justificação. Toda a gente tem direito a escolher a sua identidade sexual, a sua religião, a sua nacionalidade ou de quem gosta. De cada vez que alguém é julgado por ser muçulmano, homossexual ou negro, estamos a reviver toda esta panóplia de sentimentos que julgamos não serem nossos.
Somos todos iguais e cada vez mais tenho a certeza disso mesmo. Aqui na Polónia ou em Portugal, encontro o mesmo tipo de pessoas. Pessoas que me atraem, pessoas que vomito de cada vez que falo com elas. Deveríamos ser todos sinceros e não precisar de exigir ou fazer aquilo que não queremos. Temos tão pouco tempo para fazermos e sentirmos aquilo que verdadeiramente nos faz feliz que nos deveríamos deixar de preocupar com o que realmente não nos acalenta o coração.
De livre vontade, reflictam se fizer algum sentido.

Wednesday, December 07, 2005

Cópia

Tentei de tudo para aproximar a tua certeza do meu olhar e nem por isso fui sempre bem sucedido. Copiei artigos, crónicas ladeadas de política e bom-senso para saber enfrentar essa tua necessidade de recriação que sempre me soube a alguma presunção. Sem saber como, rodeei-me de castelos que não foram construídos por mim, uma família que nunca foi um porto seguro, um rumo que eu sempre soube, seria sempre escasso demais.
Fiz-me assim forte, da tua distância, dessa omnipresença que teima em não me escapar de cada vez que entro nessa grande sala onde escuto atento, os grandes massacres humanos.
Tentei-te reconhecer nos filmes que observei, copiar a tua imagem a fim de a preservar mais respeitavelmente, conseguir conduzir por entre essa trajectória de palavras, aquilo que o ar nunca me deixou aspirar. Esqueci-me irremediavelmente, de que não é a arte que copia a vida, mas sim o inverso.
Vemos histórias passadas nessas grandes metrópoles, onde as pessoas se atropelam para conseguirem um lugar apenas um passo à frente, olhares que queríamos todos que fossem nossos, encontros desencontrados a que nunca diríamos que não, uma inveja sentida e nunca admitida. Tem de ser tudo em câmara lenta, em projecção afinada, com uma música de fundo a fazer-nos lembrar a adolescência.
Na verdade, as cópias nunca serão fiéis ao original, ficaram sempre aquém dessa magnificência que é a marca da primeira vez que somos tocados por algo. A vida acaba por não focar tudo aquilo que prevíamos nessas tramas elaboradas, apenas para pensarmos que o amor é uma construção, arquitectada à última perfeição, idealizada por um olhar certeiro, uma noite perfeita, um local preciso.
É devido a isso, que tantas vezes nos entregamos e enganamos. Quando tudo passa, já não importa mais. De resto, nunca nos daremos conta que a vida que levamos será apenas uma cópia moribunda de algo que nunca teremos e que talvez nunca tenhamos idealizado. Simplesmente crescemos e aprendemos desde sempre, que como tudo, também isso dependia de uma forte arquitectura, planeada a fundo.

Enquanto permaneço aqui, sonho e realizo uma história só nossa, para que ninguém mais se sinta tentado a tocá-la de maneira a que a segurança da nossa dependência mútua seja para sempre um segredo nosso e daqueles que nos observam atentamente. Consegui perpetuar a tua presença muito para além dos limites da minha consciência. A entrega, a minha entrega, faz-se assim, continuamente em ciclos que nunca param, em sentimentos que não posso conter, muito menos julgar. Não importa mais, se a perfeição é factor predominante nesse teu espelho que reflecte a minha visão, nem tão pouco saberei mais em acordar, sem sentir o teu calor permanente.
Encontro agora, no meio de tanto gelo, algo que me aquece, essa metáfora do meu ser, essa certeza nunca desfeita.
Querer-te tanto, afinal, nunca foi difícil para mim.

“If i could tell one thing to the world it would be
Not to worry
Cause worry is wasteful and useless in times like these”

Jewel_Hands

Tuesday, December 06, 2005

Intangibilidade

Já não sei bem por onde começar a proferir essa corda que se amarra e nunca acabará por se desatar. Sem saber como, compreendo agora as mistificações das relações intemporais, proclamadas em declarações de poesia, que sempre me soaram a um vazio gélido.Por isso escrevo, a fim de encontrar uma fuga para essa explicação que raras vezes não tarda em chegar, essa síntese de um amor sublime, como deveria ser o teu olhar, quando não me sentes por perto. Achei que se te encontrar num lugar profundo, consigo arrancar de ti tudo o que sempre quis ouvir e nunca hei-de conseguir proferir. Problema de expressão, há-de ser sempre o meu, mesmo sem grande razão, onde me afundo sem nunca me sentir, sem nunca te ter por perto.Não estou mais preocupado com o meu riso que alcançará sempre tonalidades ora excepcionáveis ora execráveis. Serás sempre assim, por entre aquilo que sinto e aquilo que mordo, o que me segura e o que me alimenta, a entrega possível e desejada, a maçã roubada. O meu pecado por fim, como se amar o pudesse de facto constituir.Substituí-te a curto prazo pela bebida, que não exige nada de mim e acaba por ter o mesmo efeito em mim que a tua presença - a alienação completa do que está à minha volta, para apenas me concentrar na obsessão absurda que é o teu corpo.Corro então, os balcões em que todos dormimos, finjo que me rodeio de uma intangibilidade despreocupada como se o vento não me cortasse as orelhas, como se não fosse isso que eu quisesse, nas muitas das vezes em que me cercam com verdades que só eu esperava saber.Preciso de outro mote, de outra carga, do teu peso e da tua comodidade. Preciso de sentir o que já senti, de lamber as minhas feridas a fim de estar completamente – e que sonho – pronto para ti, quebrar essa regra a fim de equacionar a solução para um problema que cada vez há-de receber menos importância.Fácil é sonhar em querer, difícil há-de ser sempre ter o que nunca conseguiremos ter, pior é termos a consciência que nunca o teremos.Vou ser sempre mais feliz, enquanto conseguir perspectivar um plano conjunto, nesta idade que corre depressa de mais e se fecha sobre mim, para que no fim eu seja ainda uma criança. Mentiria se dissesse que não és. Perder já não faz parte de mim.


We should all be praying for time

Wednesday, November 23, 2005

Visão

A minha inspiração és tu. A minha ferida enrolada em carne viva, a minha experiência conseguida e arrancada do fundo da minha dor dormente. Fiz-te assim à minha imaginação, partilhei vidas e construí domingos solitários com alguém ao meu lado, porque sempre soube que chegarias e me reconciliarias comigo próprio. Quero esquecer a tua inactividade que tantas vezes me frustrou e concentrar-me no telefone que teima em não tocar, a fim de ouvir a tua voz que sempre me chamou.Falta-nos sempre coragem para alcançar o que sempre queremos. Deixamo-nos estar nessa forma inerte e pesada que é a nossa diária preguiça mental para nos esquecermos que podemos também ser felizes.Corri sempre na tua direcção e nunca te encontrei. Inventei amores que não se sentiam, paixões que não colidiam. Entreguei-me também eu nessa força que é a plenitude de não se viver. Procurei-te na noite e na música que me ensurdecia esperando sempre essa casualidade que me havia de matar, já eu sabia. Estiveste ali a um alcance da minha perspectiva, da minha oblíqua visão, e eu perdido nessa graça que é não compreender como se acorda, não pressenti que tudo poderia ter acabado ali.Foram tantas as palavras que proferi sempre, antes de me deitar na esperança do alcance dessas mãos que haveriam de ser minhas; poderia ter evitado tanto se o meu pedantismo não fosse reconhecível aos meus olhos…Qualquer coisa como fazeres parte de mim.Falta-me tempo, falta-me o dia que se rompe demasiadamente cedo, falta-me essa inutilidade que me corrompeu. Inventei tanto sobre ti, escrevi tanto sobre ti, que quando acabei por te notar, simplesmente não estavas lá. Não estavas comigo.Por isso atiro-te com essa almofada cheia de pena(s) para que percebas, mas para que não te magoes também, que o que sinto é um fardo inexplicável, que a fragilidade da dependência nunca me seduziu, que as tuas calças de ganga sempre me pareceram um pouco justas de mais.Não sei já, se te disse demasiadas vezes que espero o reencontro com o perfume que nunca usas. Tocar-te nem que seja por um ínfimo minuto, o mais longo da minha vida. Quis sempre tanto sentir o que sinto e partilhá-lo com alguém que agora que chega esse solene momento, me sinto derradeiramente pequeno demais para o conseguir fazer. Que as palavras não sejam precisas, que o silêncio seja apreciado juntamente com a combinação das nossas feridas que hão-de crescer para nos atormentar, sempre.Sinto-me um fantasma, por entre esta cegueira permanente.“Amo-te como se não houvesse amanhã”."

(…) Ghosts have just as good a right In every way, to fear the light, As Men to fear the dark."Lewis Carrol

Friday, November 18, 2005

Afirmação

Gostava de ficar por aqui, a fim de partilhar a essência translúcida da cor dos teus olhos. São sempre eles que me guiam, entre vozes que escuto quando percorro esses corredores que nunca me pareceram honestos. De vez em quando, percorre-me ainda um medo sincero de não ter mais tempo para agarrar, de calcular demasiadamente o preço da nossa relação que acabará sempre por custar mais do que teremos para oferecer.Nunca é fácil. Constroem-se casas que nunca havemos de habitar, pontes que supostamente nos hão-de levar a algum lugar onde poderemos respirar mais sobranceiramente. Por isso fujo da tua imagem, artilho-me com bombas e preconceitos, julgamentos que nunca quis objectivar, mimos dados a outro alguém que nunca há-de os merecer. Queria-te assim, no sofá à minha espera, como se o mundo lá fora fosse frio demais, como se o nosso suor bastasse para nos iludir também.Agora que aqui estou, peço sempre mais, exijo ainda mais. Quero ultrapassar os erros, quero viver por entre esta experiência, quero acordar quando apenas só tu estás ao meu lado. Fico reticente, atravesso este idioma como se o dominasse e finjo que te encontro, mesmo quando não te busco, mesmo quando nunca estivesses lá.Queria-te aqui, de noite, que é quando adormeço e me sinto mais vulnerável, mais inseguro, mais frágil. Agarro-me ao que tenho, mas o que tenho nunca há-de ser comparável ao que sempre tive ao teu lado.Desisti já de tentar entender, por detrás dessa objectiva que tanto me esmaga, a razão de tanta falta de sensibilidade de alguém que só me mostra que apenas contém isso mesmo. Sinto-me perdido, tantas e tantas vezes, nessa roda dos ventos sem direcção, embrenhado nas tuas imagens que se formam cada vez que respiras, por entre isto que sinto e que não posso nem quero largar mais. Deixo-me ir sem controlo, sem perseguição, mas sempre com vontade que me perguntes e que me faças dizer o que realmente sinto, porque esta incapacidade indigna que trago comigo pode ser fardo demasiadamente pesado, para alguém tão leve como tu, segurar.Fora de ti, fora desse corpo que carregas, nada faz sentido. Onde só tu encaixas, onde só tu permaneces. Os outros não importam mais, os outros não hão-de importar nunca mais, porque agora que sinto o frio a congelar a minha cara em todos os aspectos, sei que foi aquilo que sempre procurei entre autocarros vazios e guitarras desafinadas.Não quero uma explicação. Sei perfeitamente que o amor há-de ser sempre o mesmo, que o tempo não é controlado por essa máquina a que chamamos Deus e que o piano que tantas vezes tocaste enquanto adormecia, faz agora mais sentido do que nunca.Não quero uma explicação, apenas uma afirmação sucinta e básica como sempre fomos, como sempre nos entregamos. Revela-me porque é que nunca esperaste por mim, revela-me onde escondeste essa força que agora te trouxe até mim. Sussurra-me para que ninguém escute, para que ninguém se aperceba que o que tens é muito mais do que o que mostras.Jura-me apenas que não estou errado. Que quando esta dor aperta e me sufoca, te encontrarei um dia mais tarde à minha espera, que o que sinto não se pode extinguir, que tu és a materialização da verdade para mim. Leva-me contigo e levanta o teu mundo para que eu o possa perspectivar. Faz-me querer mais de ti, dá-me apenas mais um bocadinho de ti. Jura-me apenas que nunca estive errado.

“Love will be the same”The Gift

Thursday, November 17, 2005

Pela metade

Somos e continuaremos a ser, apenas uma sombra do que poderemos ser. Vivemos um pouco enjaulados demais, a esconder o sofrimento, a espalhá-lo um pouco mais pelo corpo, para que não se note. Escondemos as lágrimas, mas nunca o passado, essa fábula encantada que nos despreza e odeia.
Corremos assim, fieis ao nosso instinto, num mundo que ser quer ocidental por força e por falta de vontade, rodeados por uma ideologia que se sobrepõe à massa unificante para apenas a estabilizar.
Crescemos então um pouco concentrados no que poderemos vir a ser, sem nunca notarmos sequer o que já somos. Tudo passa a ser um fardo, tudo se quer fácil e exíguo, sem manchas ou podridão. Por isso mergulhamos a fundo na noite, espreitamos um bocado em todas as bolas que rodam um pouco por toda a cidade, a fim de encontrar o eixo acertado. Acabamos por fechar os olhos e deixamo-nos ir, nesse sentimento infectado que não é nosso, mas que sempre gostaríamos que fosse. Na verdade, tudo passa à nossa frente. Imagens e imagens compostas por palavras frias e corpos baços que se juntam e se desintegram, para no dia seguinte não se reconhecerem.
São poucas, na realidade, as capacidades que possuímos, entre os glamorosos erros que presenciamos nesse relógio que jamais irá despertar. O sexo passou sempre a ser a fonte de prazer mais fácil de atingir. Tornamo-nos escravos, um pouco, do sabor da nossa carne, que acabará sempre por saber a um descontentamento bestial. Por isso procurámos mais, por isso perdemos continuamente a consciência que o sexo é e deve ser algo partilhado numa intimidade imparcial, que nos conduza a uma experiência dignificante em quanto ser que se querem humanos. Procurámos tantos a felicidade, proclamamos leis para a atingir, mercados onde a comprar, mas nunca nos damos conta do quão fácil será evitar a necessidade da ilusão que nos levará sempre à infelicidade.
Provavelmente será sempre o mais fácil. Há tantos como nós, ávidos por saltar fora desta rotina mórbida que nos torna apenas metade do que poderíamos ser, que pensamos que o que sempre foi proibido e julgado, há-de ser o melhor caminho para um momento despreocupado e desencarecedor. Deixamos portanto de brincar aos adolescentes apaixonados, que dizem “amo-te” como quem compra uma camisola da nova colecção da Bennetton, para nos envolvermos o mais depressa possível, porque dizem-nos que a vida é curta, nesse jogo de artimanhas e pescarias que são as relações fornecidas pela maioria dos adultos.
Em pequenos, deviam nos ensinar e incutir, como tantas outras coisas que nunca havemos de aplicar, que o sexo longe de ser algo pecaminoso, é suposto ser algo comprometedoramente saudável, um acto de transferência de intimidade e carinho sem igual. Uma entrega do corpo e parcialmente da alma, que nos leva ao extremos de nós próprios a vasculhar o corpo de alguém. Vai, de facto, muito para além de uma simples tesão ou de uma forte atracção muscular que surpreende as nossas hormonas e nos faz querer ser rebeldes.
Falta-nos um bocadinho de nós próprios. Por isso tentamos busca-lo em todas as caras e corpos, a fim de preencher esse vazio que tanto se avizinha. A consciência de que algum dia poderemos encontrar alguém suficientemente valioso para essa entrega máxima, sempre nos passará ao lado. Somos livres e proclamamos essa liberdade, como se o Muro de Berlim só agora tivesse sido derrubado.
Acho que sempre nos faltará um pouco de nós.



Looking for some educationMade my way into the night
All that bullshit conversationBaby can't you read the signs?
I won't bore you with the detail babyI
don't even wannna waste your time
Let's just say that maybeYou could help to ease my mind
Baby, I ain't Mr. Right But if you're looking for fastloveIf that's love in your eyes
It's more than enough
Had some bad luck
Some fastlove is all that I've got on my mind
Hey baby, Looking for some affirmation
Made my way into the sun
My friends got their ladies
They're all having babiesI just wanna have some fun
I won't bore you with the detail babyYou gotta get there in your own sweet time
Let's just say that maybeYou could help to ease my mind
Baby, I ain't Mr. Right But if you're looking for fastloveI
f that's love in your eyes
It's more than enoughHad some bad luck
Some fastlove is all that I've got on my mind
Get yourself arrested for love
So closeI can taste it now baby
So close In the absence of security
Made my way into the nightStupid Cupid keeps on calling me
But I see nothing in his eyesI miss my baby, oh yeahI miss my baby tonight
So why don't we make a little roomIn my BMW babeSearchin' for some peace of mind
Hey, I'll help you find itI do believe that we are practicing the same religion

G.M. Fastlove

Thursday, November 10, 2005

Evidencia


São raras as vezes em que acerto verdadeiramente na perspectiva do teu olhar. Não sabendo como, fui-me deixando ir nesta dor inabalável de quem me diz sempre que o amanhã será mais rápido do que o momento fúnebre que se vai vivendo dia-a-dia.
Persigo-te entre terras e verbos que desconheço mas que uso de uma maneira sublime, apenas porque a intuição que trago não me deixa cair nesses olhos cor de terra, de quem já sentiu pouco e por isso mesmo desconhece o que é sofrer, apenas porque se existe. Como se houvesse alguma validação nesse pronuncio, nesse fado tantas vezes repetido à exaustão, nessa panóplia de lentidão assemelhada à liberdade que tantas vezes proclamamos.
É tudo um conceito. Somos fieis ao que nos ensinam, ao que nos apontam, àquilo que os outros fazem e raramente à música que muitas vezes tocámos sozinhos na escuridão do sótão em que quase todos vivemos. Arrisco-me a negar a evidencia que corre pelas imagens, nesta música sorrateira que me embala.
Massacram-me com perguntas acerca da cor do céu, do comportamento dessa máquina que é o ser humano, como se eu possuísse alguma verdade por entre esta tristeza que tantas vezes trago.
Não quero e desisti de o pedir já, mais do que me tens oferecido. Sei e reconheço as limitações de cada uma das nossas mãos, entre palavras que não flúem entre ti, entre essa especialidade de humor não corrosivo. Só quero ter controlo daquilo que sinto, desta transcendência que abarco, desta projecção de sentimentos que invariavelmente nunca saberei explicar. Gostava de tocar esse mar, de voltar a ser inundado pela melancolia de Sophia, beber dessa inspiração máxima de Eugénio a fim de repousar um pouco na simplicidade de Torga.
Ninguém me disse que seria fácil, ninguém cometeria um devaneio de densidade tão dramática, ninguém me deixaria sozinho. Por isso fixo o olhar na tua imagem, percorro as escadas de algo que sinto a fim de encontrar a razão que sei que nunca irá existir.
No fim, só restarás tu.

“Estou mais só do que sozinho
Chega mostra me o caminho
Leva me pra casa…”


Lúcia Moniz

Sunday, November 06, 2005

Segurança

Não quero, nem espero que me ofereças mais do um abrigo para este feitio massacrado que trago em mim. Procuro-te na comida que faço a fim de saborear um pouco mais de ti, a fim de sonharmos os dois entre nuvens que nunca hão-de chegar até nós.
Amar nunca foi, percebo agora, um fardo inconsequente ou árduo sequer para mim. O encontro com a desilusão e a finalização da ilusão é sempre algo muito mais duro que nunca percebi muito bem porquê, não suporto. Faço de conta já que não escuto as longas promessas que me fazes um pouco mais alto do que a música que o vizinho passa a altas horas da noite, quando bebe um pouco mais do que consegue, também.
Tenho um medo descontrolado de não conseguir arcar com essa ternura que carregas em ti, esse mimo deambulado que me deixa ser apenas morbidamente teu. Leio os romances que sempre me apaixonaram, recordo as músicas que a tua boca prometeu e eu que pensava que nunca encontraria nada assim.
Por isso e continuamente, fujo ainda de ti, para que tenhas essa ânsia também de me encontrar. Armo e arquitecto, como bom manipulador da retórica que sou, pela força não da vida, mas das circunstâncias que me foram sendo impostas, intrigas desmesuradas, perfeitas tonterias que imponho apenas para controlar o início e o fim de algo que sempre saberei ser pequeno demais para aguentar.
De vez em quando estremeço, o corpo abana-se mais um pouco e por momentos, acabas por vir até mim, passas por cima das barreiras que fui impondo a mim mesmo, um pouco como toda a gente e acabas com este enredo que crio apenas para me sentir mais seguro. No fundo, sempre o que quis, o que todos nós queremos, alguém que nos amarre nesse poço de segurança e que acalme a rebeldia que vive em nós e nos embale antes de nos deitarmos. Não percebo, já há algum tempo, se deveria sentir algum embaraço por ter a consciência que aquilo que escrevo é realmente aquilo que sinto.
É que esta espécie de dor, esta marca que tão apressadamente me colocaram não tem mais tempo por onde correr, nem explicação por onde se encontrar. Enquanto isso, fujo com o piano nas mãos, a fazer de conta que ainda hei-de tocar a melodia que despertará a força que secretamente vive em ti e que teimas em fingir que é apenas mais um dos meus devaneios contemporâneos de alguém que pensa de mais.
Vezes há, em que me perco na minha rota, escrevo não o que penso, mas o que toda a vida ouvi, caio e acabo por me sentir um pouco mais humilhado. Adormeço apenas para me sentir um pouco mais perto de ti e quando acordo o amanhã que sempre esperei já é o hoje que nunca quis encontrar. Há flores que encontro que talvez fossem para ti, há dores que sinto e que nunca consegui partilhar contigo. No fundo sei que nunca ninguém alterou tão rapidamente a distância do meu olhar, que me fez entregar tanto, fazendo do tempo e do próprio espaço esse mistério indefinido, que sempre acabará por ser. Encontro-me separado por milhares e milhares de estradas, desencontrados, apesar de voltarmos sempre à mesma rua de sempre, aquela que tantas vezes conhecemos e tantas vezes quisemos que fosse nossa.
Procuro-me ainda no vento nórdico que por ironia teima, como tu, em chegar. Saberei eu muita coisa sobre os sentimentos e sonhos que deveria ter sonhado e vivido, desta experiência que abraço com a força da tua imagem, deste sentimento que me traz sempre para um abrigo mais do que seguro. Saberei eu muito sobre películas que passam na tela sem que as pessoas se apercebam que é a sua vida que está a ser mostrada, saberei eu muito sobre ti, embora não tenha encontrado – com pena - a chave para tanta partilha.

Ouço ainda a nossa canção, um pouco à espera da tua voz, um pouco à espera do teu corpo, um pouco à espera de ti. Não te rias de mim, tudo o que eu sempre procurei encontrei nos teus olhos, numa luz impertinente que nunca mais saberei onde buscar outra igual.

You smile at me like a Jesus to a child
Guess why.

Wednesday, November 02, 2005

Reconhecimento

Reconhecimento

Estou um pouco longe, perdido na noite, embrenhado neste sentimento que não me deixa fugir, na esperança de te alcançar, nem que seja por um olhar.
Agora percebo que não sou livre, que não tenho controlo da escrita que levo, nem da vida que escrevo, que me deixo ir inconsciente por esta trama pegada, desconjuntada por livros que pego apenas para absorver o nevoeiro que cresce lá fora. Lá fora é onde tudo se passa, onde me esqueço que existo, onde nego que as todos hão-de sempre achar que alguém apaixonado não passa de um tolo inconsequente e sem responsabilidades neste mundo um pouco mais do que moderno.
Por isso salto, para estar à altura de esperar por ti, como sempre espero, entre histórias que me contam e cortinas que não tapam a memória que possuo ainda de ti.
Via-te a chegar e não havia espaço ou tempo que me eliminassem logo ali, do teu sabor que eu ainda haveria de provar. Explodir nessa tua força que me rejuvenesce, fazer desaparecer essa fraqueza que tanto finges ter.
Colo as tuas fotos por todo o quarto, finjo que não te reconheço apenas para me fazeres dormir de noite. Estou farto de sentir o perigo enquanto caminho na rua sozinho, farto de tentar procurar a paz que sempre esteve escondida para ti, dentro de mim. Agora só preciso que me mostres, que me ensines, que me acompanhes e permitas que continue sempre neste voo. Que as memórias que tenho de ti sejam cumpridas, que me ampares quando voltar a chorar, porque ainda hei-de chorar muito, apenas porque me ajuda a adormecer um pouco mais rapidamente, sem ter de equacionar a solução para os problemas que ainda hão-de vir.
E serão todos bem mais fáceis contigo.


“if you were in a different corner, we would never happen”

Monday, October 17, 2005

Crença

Queria te dizer que és a razão por detrás de todas razões, que não há fado, nem discrepância magnética que me afaste da tua imagem simplesmente irreal de alguém que nunca existiu, mas que sempre me tocou. Durante tempos fui ateu da minha própria descrença, temendo a fundo encontrar a razão para tanto sentimentalismo – que fingidamente chamei de pedantismo tantas vezes – nos poemas por detrás dessa obra que nunca há-de nos deixar de marcar, Lusíadas. Tentei encontrar no histerismo de Fernando Pessoa uma razão convincente para o desencontro com o próprio amor e descobri contigo, que nada percebes destas leis literárias, que aquilo que sempre procurei era afinal aquilo que sempre havia fugido, que as ideias que persigo hão-de chegar mesmo quando não existir um refúgio que as mantenha salvas de mim mesmo e dos outros também. Por isso rio-me daqueles que não acreditam e fazem julgamentos desviados e intricados naquilo que o que lhes rodeia lhe oferece. Não é condenação que merecem, apenas um olhar repentino, como se não merecessem mais. Por isso rio-me da minha própria felicidade, da minha própria alma que encontra uma melodia mais própria, mais audaz, mais corajosa cada vez que te toca. Talvez isto não passe de uma consequente alucinação provocada pelo frio nórdico que se avizinha, ou pelas saudades que dia a dia me dizem que nunca tive tão certo como agora estou. Saudade, essa palavra tão característica e tão portuguesa, que nos corre nas veias e nos transforma nesses seres melancólicos e tenazes, fugidios e cinzentos. Mórbidos. Essa “alegria de estar triste” como havia dito Agustina Bessa L. Queria dar-te mais do que consigo oferecer, mais do que tenho, mais do que consigo expor. Afinal não é fácil. Nunca é.

Não pode no mundo haver tristeza
Em cuja causa, Amor não esteja presente?”

Luis Vaz de Camões

Tuesday, October 11, 2005

Contradição

Contradição


Estou a contar os dias para poder regressar até ti, afastar-te de todas as promessas que nunca foram cumpridas e esperar por este tempo que nunca mais regressará.
Que não te perco, que não és material, que te persigo por entre sonhos em que te toco e imagens refeitas pela minha alucinação constante.
Bebo pelo saber que me trazes, pelo entusiasmo que me provocas, pelo riso com que me deixas. Não, o amor não é suposto ser fácil, porque exige que nos transcendamos e nos tornemos naquilo que nunca havemos de conseguir ser : perfeitos. È apenas uma graça desse Deus mesquinho que quis prolongar a nossa ambição de sermos o que nunca conseguiremos ser.
E eu, cego que hei-de ser, continuarei a perseguir essa imagem concebida numa infância composta e descomposta por relações que nunca conseguiam ser feitas, quanto mais desfeitas. Quando era mais pequeno, perguntava-me porque é que os adultos falavam tão alto, porque proferiam palavras que só mais tarde haveria de perceber. Hoje, sei apenas que é o medo de continuarmos entupidos nesta vida que tanto nos atormenta, que nos diminui. Desta necessidade baça que é termos de ter alguém suficientemente mais forte do que nós, apenas para o peso ser repartido.
Não, o amor não há-de ser fácil e eu já apaguei essa ilusão da minha violenta consciência. Queria tornar tudo incandescente. Ser adolescente outra vez e viver o que ainda não vivi, agarrar-te pela mão e sussurrar-te ao ouvido que há muita mais vida para além do que todos proclamam. Que é isto que sentimos e que vivemos, que são estas viagens intemporais que nos deixam agarrados ao sofá durante horas que nos tornam mais profundos e seguros.
Sim. Há certos fantasmas inocentes que continuam a inundar a minha consciência, mas que continuamente os enterro na neve e no gelo, para que não consigam respirar, porque eu sou tudo aquilo que me dás.
Era assim que toda a gente devia morrer.
Apaixonada.


Cada um morre ao ritmo que vive

“Pode um desejo imenso
Arder no peito tanto.
Que à branda e à viva alma o fogo intenso
Lhe gaste as nódoas do terreno manto.
E purifique em tanta alteza o espírito
Com olhos imortais.
Que faz que leia mais do que vê escrito…”


Luíz Vaz de Camões

Thursday, September 29, 2005

Amar não acaba, nunca.

Não repitas isso. Havemos de chegar sempre a onde só chega “ quem não tem medo de naufragar”, como se a vida fosse mais do que este correr desenfreado que encetamos todos os dias. No fim, nem o tempo há de chegar para entender e comprimir tanto desejo de amar.
E eras sempre tu, mesmo quando eu não o merecia, mesmo quando não cumprias o que prometias, quando não me compreendias como sempre me disseste que o farias. Gostava de te ter aqui, a fim de te mostrar que és o fundamento para tudo ser mais difícil, que não há outra imagem que me passe pelos sonhos, pela calada sem eu o saber. Por isso, tento conquistar-te de longe, mesmo sabendo que nunca me hei-de livrar de ti. Nem quero. E o tempo já correu contra mim…
A verdade acabará por ser só uma e não será a distância que me revelará o que sempre senti. Que preciso de ti, que te quero só para mim, a fim de te mostrar o meu pequeno mundo, que a distância destrói-me, mas deixa-me motivado para continuar em frente. No fim, só restas tu.

“Nunca disse que seria fácil entrar dentro de mim”

Nunca tive à espera de uma facilidade desinibida, de um puxão contra o vento forçado, de uma luz transparente que me revelasse tudo aquilo que sentes, agora, enquanto lês este texto.
É a noite que me traz a tua presença, é esta dor que passou a ser física, apenas para ser suportada de uma forma mais sobranceira e honrosa. Talvez nem sempre tenha estado à altura do desafio que o teu olhar me propôs, mas fiz sempre o que pude para conseguir passar por cima das limitações que me foram sendo impostas. É difícil dizer que preciso de ti, custa-me admitir que não consigo percorrer esse corredor de vozes que nos afundam tantas vezes, sozinho, como outrora consegui. Mas há-de sempre custar-me mais enfrentar tudo isso se não souber que ocupo o teu pensamento, tal como tu ocupas o meu. Não é racional. Nem é suposto ser concebido a partir de um estratagema inocente. É apenas algo que não consigo conter quando percorro esta cidade que desperta em mim uma inspiração transcendente acerca de tudo o que me rodeia, mas que inibe a minha dissertação acerca do quão grande deliceramento consegues provocar.
Não é desculpa que quero pedir. Não é auto mutilação que peço. Apenas aliviar este amar que não acaba. Nunca.

“Os sonhos são os mesmos, em todos os lugares” Inês Pedrosa

Thursday, September 22, 2005

Amar nunca acaba

Nao me despedi de ti. Encontrei-te perdido sem olhares cruzados onde tu eras a cor e o chao que me davam uma realidade mais sobranceira. Nunca escrevi sobre ti como tantas vezes fiz. Nunca contei o meu desespero de te perder ou a minha incapacidade de reter a tua mao, sobre essa luz escassa da qual fujo ainda, cego que sou, ofuscado que serei sempre que permaneces ao meu lado.
Tenho ainda medo que algo te leve para longe de mim, por isso nao escrevi, por isso nao contei, por isso tornei me espelho de uma realidade que nunca conseguirei deixar de ser, apenas para ninguem suspeitar a forca que vive ao meu lado.
Custa-me sofrer e custa-me fazer te sofrer, mas como Frederico Lourenco referia, "Viver sem chorar nao e viver".
Nao. Contigo nem sempre foi a textura que eu sempre idealizei, nem a partilha que sempre tentei alcancar. Sem saber porque muito bem, deixei-me nesse teu amor que me tornar indiscutivelmente mais fraco, mas mais corajoso.
Agora sei porque nunca escrevi sobre ti. Porque nao ha nada que eu possa escrever que te faca voltar para o meu lado e repetir suavemente as palavras que tantas e tantas vezes proferias, quando me lembrava de fazer alguma birra digna de uma resposta a altura que tu raramente me davas.
Nao ha nada mais que eu consiga transmitir. Todo este amor que sempre senti cala-me e sussurra-me que ha certas coisas que e melhor nunca sairem de dentro de nos, apenas porque eu sei que tu ja as sabes. Que te amo, que talvez sejas "para sempre", que estou longe mas que estou sempre contigo, que me entopes o pensamento a ponto de eu ficar bloquado quando sou obrigado pela forca do coracao a transmitir alguma coisa por ti. Custa-me tanto...como sempre custara.
Na neve encontrarei a fuga para esta tua perseguicao constante nos meus sonhos. Por enquanto - e como sempre - fico a espera de encontrar o teu olhar.

Acho que nunca me vou despedir de ti...

You were right
and i don t wanna be here
if you gonna be there
was that supposed to happen?

Amar nunca acaba. E como se o mundo tivesse a minha espera. e eu vou ao encontro do que me espera.
Clarice Lispector

Nota: no teclado polaco faltam algumas teclas, como os assentos...

Tuesday, August 30, 2005

Instituições

Amor, Sexo, Casamento. A partir destas três instituições fizeram-nos crer que tudo deve preencher o mesmo espaço, como se de sinónimos se tratassem. Injectaram-nos estas verdades pouco transparentes numa sociedade edónica que se deixa levar pelo prazer, mesmo quando este não compensa.
Estranho, no mínimo, que nos continuemos a deixar guiar por estas questões implementadas por uma falsa moral, que tem apenas alguns propósitos que nunca nos levaram a lado nenhum. Estranho é, que numa sociedade que se discute tanto, se questiona tanto, haja tanta pouca gente que consiga atingir um distanciamento que nos faça pensar com clarividência. E pensar é sempre o acto mais violento, já apontava essa gulosa pelas palavras, Agustina B. L. Continuamos a perseguir essa ideia errada que os homens têm uma predisposição nata para o sexo, como se de uma obrigação ou lei se tratasse. Como se valesse a pena fazer sexo, mesmo que este seja mau, sujo e inútil. Como se fosse ele – e sabemos sempre que não – o grande chamariz das grandes cruzadas ou a luz que nos guiará a um lugar mais seguro. Vivemos na chamada “hipocrisia de classes”, em que nos atacamos mutuamente, sem que para isso arranjemos soluções dignificantes, sem que para isso percebamos que o nosso próprio bem estar deve vir primeiro do que qualquer instituição, seja ela de que carácter for.
Por isso, entre tantos outros factos, que nos foi incutida a ideia de que o sexo deve ser só depois do casamento, como se dele dependesse toda uma relação. E quando apenas a presença da pessoa que se deita todos os dias nos preenche, nos eleva, nos consegue transmitir toda aquela paz que sempre procurámos nas grandes festas da nossa família? Limitamo-nos a seguir aquilo que ouvimos ou lemos, apenas por a maioria não conseguir perspectivar o que os condutores do programa “Estes difíceis amores” conseguiram. Não queremos nada e queremos tudo, através de fases que nos implementaram, planos e esquissos de relações modelo em que tudo deve ter um lugar para começar e acabar. Em que a mulher, seguindo esta trama, acabará por facilmente se descartar do homem quando esta moral pós-moderna terminar, já que o seu único propósito é e sempre foi a proliferação da raça humana. Quando estes agentes neo-liberais se aperceberem que o homem já não é preciso para que uma instituição funcione e prossiga, não haverá mais espaço para este, já que a mulher num futuro próximo será capaz de continuar o processo de fecundação, sem que para isso seja preciso a presença física de um homem ao seu lado. Porque é isso que nos incutem, desde pequenos ideias planas e terrenas, quando só devíamos ver desenhos-animados que nos falassem de algo que será sempre intocável.


Falam-nos do homem que tem de coleccionar uma caderneta de cromos sexuais, mesmo que este não tenha gostado e de mulheres que serão mais reticentes a esse facto. Falam-nos de tanta coisa, que acabámos por pensar como os americanos que se ridicularizam com frases do género, “o sexo é como a pizza, quando é mau consegue ser bom”.
E quando um dia, um homem qualquer acordar e não lhe apetecer ter sexo, violento e puro, como lhe ensinam no “Levanta-te e Ri” vai ser motivo de gozo e de reprimenda, só porque a ele lhe chega o contacto emocional, só porque a carne não o excita mais, só porque encontrou apenas o caminho para uma paz feliz.
Não é disso que andámos todos à procura, afinal?

"Gosto de ter o melhor sexo possível, por isso, sempre que posso, faço-o comigo" Woody Allen

Saturday, July 30, 2005

Fotografia

Gostava de te reter, permanecer em ti, agarrar nas fotografias e torná-las a grande imensidão que é a nossa solidão. A verdade - e podem ser tantas - é que só penso numa maneira, ínfima que seja, de chegar até ti, de acabar com esta fome de te ter e finalmente, descansar.
São equeações mal produzidas, pensamentos que nunca se chegam a realizar, compreensões de um "eu" que não entendo e estupidamente continuo a perseguir.
Gostava de te ter só para mim, de morrer entre ti e acabar de vez com esta guerra de cheiros que não pára, desta profundidade que nem eu concebo, que nem eu percebo.
E é só disso que se tratar, de um problema de expressão que se cola, e me desgasta, que me persegue e que não me deixa encontrar o melhor termo.

"Amo-te"


Tira a fotografia da parede
Não há mais nada que possas provar
Há um mundo que desapareceu
Uma alegria que nunca mais voltará
Não te vale a tua opinião
Nem tão pouco a razão,
Alimenta-te do que terás
Porque não será muito
Por isso, vê o que conseguiste

Vê o nada em que te enclausuras te
Repara no comboio que passou
Não há nada que o faça voltar…

Tira a fotografia da parede
Ela nunca te trará de volta
Nunca te trará de volta
Tira a fotografia da parede

E eras tão bonita quando choravas
Quando te enervavas, quando existias
Ainda em mim, objecto que passou
Paixão que cessou
Olha à tua volta
Quebra o silêncio
Repara na solidão que se tornou tua proprietária
Ela nunca te fará trazer de volta
Não há nada que o faça voltar…

Por isso tira a fotografia da parede
Ela nunca te trará de volta
Joga-te na única promessa da vida.
Ela nunca te trará de volta,

Por isso olha à tua volta
E vê o que fizeste
Planar em vez de voar não é solução…
Agarra na fotografia
Ela é tudo o que tens.


A Manuela Azevedo é que tem razão, tudo fica melhor com o inglês. Por isso chego-me até ti e luto contra mim, na esperança que percebas que as palavras hão-de ser sempre pouco para agarrar nesse vácuo que ó amor.

"E é tão difícil dizer amor..."

Para ficar mais perto da tua imagem, desse rebordo em que me transformas, desse metade que nem dividir consigo. Apago as fotografias a ver se isto se esvai, a ver se o sangue pára, a ver se eu páro. Apago as fotografias a ver se me esqueço que o mais dificíl é suportar o amor nas nossas mãos, encontrar-lhe a saída para uma felicidade conjunta, uma ligação que seja mais do que uma música melancólica, incapaz de traduzir esse girassol de coisas confusas que se englobam nesse verbo que nos domina e nos contrai os músculos, mesmo os mais fortes, como se fóssemos de borracha, quando só queremos ser de aço.

"Para ficar mais perto, bem mais de perto"

Como se a morte não fosse isso mesmo, ficar bem mais de perto daqueles que nos querem e se lembram do nosso retrato, mais do que uma memória, mais do que um rascunho. E és tão bonita em todas as fotografias em que te consegui captar essa aura que tantos tentaram captar. Queria voltar atrás, adormecer contigo, quando era acordado que sempre preferia adormecer, quando era só contigo que preferia andar.
Gostava de permanecer em ti, ser mais do que tonto amar, perspectivar a tua cara que sempre me impulsinou e saber o que fazer, mesmo quando sei que nunca voltarei a estar contigo. Ès tão bonita...

"You´re beautiful, it´s true..." James Blunt

Thursday, July 21, 2005

O Segredo VII

Gostava de repousar em ti, perceber finalmente que estou morto, de que é que és feita. Afinal o que te recolhe, porque foges sem fim ou retorno, porque não me mereces e mesmo assim eu te perdoo, ou porque é que nem sequer te consigo pergntar porquê...Nem nunca conseguirei. Quero-te assim, minha, nessa tua luminosidade que me arrastou, nesse teu sexo que me fez evaporar entre caminhos e sensações que sempre julguei esquecidas, lá dentro. Cá dentro.
E é por entre este sonho de te reencontrar que por aqui permaneço. Foi este teu Deus sádico que me pregou à tua existência e me força a ver o teu fim, lentamente.

"Quem muito fornica acaba fornicado"

Sabias que era por entre a tua loucura que me curava lentamente, também, das doenças que cada dia me atacavam de uma maneira cada vez mais superior? Tantas perguntas que ficaram, tanta mágoa recolhida num vaso vazio, vaso que nunca vingou. Aqui, no lugar dos mortos e dos chorados, sinto ainda o teu cheiro, como se vivesse a vida - ou neste caso a morte - de outro alguém que não eu.

Morremos ao ritmo que vivemos


E ainda assim, rezas a este teu Deus que te traiu. Não, não será por culpa dele que eu morri e que tu terás o mesmo destino um pouco mais tarde, mas sim daqueles que te aconselham agora, apenas porque não foram capazes de impedir. Ninguém é.
Somos todos uns hipócritas, como tu referias, agarrada a uma peça qualquer que tinhas comprado num leilão qualquer, rodeado de pessoas que não interessam nem a elas próprias.
Querias o sol, querias o prazer da carne, fugir ao vazio, correr por entre o pecado. E atenção, conseguiste. És uma vencedora nata. Ergue a cabeça, por isso. A minha morte foi apenas uma baixa.

Amamos ao ritmo que sofremos


E eu sofri, muito. Mais do que o meu corpo era capaz. E por isso criei esse segredo que tu deixaste depositado em mim e que só agora descobriste. Não é a minha morte que te atormenta. O sofrimento dos mortos é algo que sempre consideraste inútil. O que te ataca é a tua própria morte e o facto de te a ter escondido, sempre, e de tu nunca, sequer, perceberes porquê. Há momentos da vida em que temos de formar uma protecção, . Protecção contra o sofrimento que possamos vir a sentir e a causar. Eu precavi-me e isolei-me na minha própria morte. Mas tu não. Nunca te protegeste. Foste sempre uma vítima impávida de múltiplas penetrações que te haviam de fazer gozar e chorar por mais. Tal como choras, agora.
Não protegeste o teu corpo, não me protegeste a mim , que havia sempre confiado e depositado as minhas forças e esperança em ti, que ajudei a criar. Ali, a minha musa dos caracois loiros, do olhar estropiado, da decência que pulava por entre o decote que invetaria sempre uma forma de se superar. E encontrou.

Queremos ao ritmo que perdemos

E queremos todos tanto. Amo-te tanto, ainda. Mesmo quando cuspia sangue, de manhã. Mesmo quando mais tarde me foi diagnosticada uma tuberculose. Mesmo quando me descobriram esse vírus dentro de mim, enclausurado nesse amor que nutro por ti. Esse vírus que parece ter sido criado por esse teu Deus implacável e inseguro, para destruir todos aqueles que prevaricam em seu nome, para acabar com todos aqueles que amam inconscientes que o amor é uma loucura, para terminar com aqueles que dia-a-dia fornicam a fim de não se olharem mais ao espelho e constatarem a grande merda que são. A grande merda que somos todos.
Querias que te tivesse dito que também ias morrer? Foi por isso que morri primeiro. Porque não suportava a ideia de te perder e chorar por ti. Embora ainda chore.
São estes sentimentos, esta culpa que também senti e que deixei como prova do meu amor. Como prova ao teu Deus que a culpa foi também minha. A culpa é sempre de quem ama. Se ao menos me conhecesses, conhecerias aquele que te ama tanto.

Tudo tem um fim

Como eu, morto por uma sigla, com a qual nunca me preocupei em perseguir o significado. E esqueci-me, também eu. Protegi-te a ti, mas não me protegi de ti, inconsciente de que tu me salvarias. Salva-me agora da tua visão, salva-te agora e acaba com o sofrimento, com a vergonha de todos saberem, com a pena que todos irão sentir. E tu odiavas a pena...Faz desaperecer essas galinhas que te buscam e te cansam a fim de descobrirem o porquê do meu silêncio.
Agora que estás mais só do que sozinha, eu continuarei aqui, fixo em ti, apaixonado por ti. À espera da tua mão, a fim de encontrar o rasto do dia em que inicialmente nos perdemos e sonhamos como gente pequena que nunca deixamos de ser. À espera que me faças regeressar a casa. Como sempre.Para sempre.

Amo-te, ainda, Joana.


"Let me go home
I´m just 2 far from where you are
Let me go home." M. Bubblé

Tuesday, July 05, 2005

Segredo VI

Ela anda às voltas, perdida no vácuo de uma morte na qual cravou a sua própria identidade.
Ainda assim – e talvez mesmo por isso – continua a tentar alcancá-lo, a fugir dos seres que a perseguem e a guardam com delicadeza, tentando romper-se e esvaziar o sangue que em si corre. Continua a fugir dos seres que a perseguem na sua cabeça e que tentam inevitavelmente compreender, o porquê de começarmos e terminarmos (quase) todos da mesma forma.
É o amor que nos estilhaça, nos torna incompreensíveis aos olhos dos que nos rodeiam, humanos que somos, falhados que nos tornamos.
Por entre tanto espaço desencontrado, memórias de um infinito recuado, Joana sente-se vigiada. Não a deixam encontrar o perdão que tanto anseia. Acredita por virtude que ele está por ali a fim de a desencontrar e fazer com que se sinta ainda mais perdida. Não percebe e talvez nunca venha a perceber que o amor é a arte do branquear, da ilusão por detrás da óptica, a música posta no gira-discos do avô com o propósito de nos fazer chorar.
A Joana perdeu-se entre uma rotina que a desgastou e cujo caminho que encontrou para sentir que esta realidade ainda lhe pertencia, a fizeram tornar num sintoma daquilo que já foi.

Queremos todos tanto

O mundo de Joana haveria de mudar, assim como a sua vida e de todos que a rodeavam. Deixou de se queixar da situação débil do país em que o país sempre estivera mergulhado, deixou de se queixar que ele nunca tivera tempo para mais do que duas horas de bom sexo seguido, deixou de se queixar do quanto estava farta de aturar pseudo-artistas, carregados de ideias neo-liberais, para quem um traço no escuro haveria de originar o Big-Bang. Deixou de ser a Joana, apenas porque são todos estes detalhes íntimos e banais que fazem parte integrante do que somos, do que sentimos, do que vivemos e queremos todos tanto...
E Joana também queria. Queria mais do que uma casa carregada de estátuas que a serviam, de quadros que a seguiam, de histórias sobre o desaparecimento da justiça. Queria sentir-se viva, mergulhar nessa fome que é sonhar, sentir o sexo a arder por detrás do telefone, por detrás da sombra que se haveria de tornar, vítima do caminho que viria a escolher.
E por entre isso, Joana ainda se perde em adorações a um Deus que sempre seguiu, que sempre acreditou, mas que passou a temer.
"Quanto pecado", dizia-lhe ao ouvido o padre escolhido para a salvar da perdição. E os padres sabem tudo sobre pecado, sobre os erros e as virtudes, apesar de nada sobre isso poderem saber a não ser julgar aqueles que os tornam credíveis e sábios.


"O amor dita o início do fim"

Joana queria voltar atrás, morrer primeiro, fugir desta angustia constante, deste sono que não cessa, deste olhar recriminatório que vê por onde passa, mesmo quando não está mais ninguém presente. Ela quer voltar atrás, apagar as memórias e encontrar a luz que tanto buscou, mas que acabou confusa nesse longo prazer que é o da carne e do fugidio, da luta dos corpos e do proibido. Agora, não finaliza os pensamentos nem se agarra mais aos momentos.
Joana nunca amou. E por isso, não percebe que ele sempre soubera que ela passara a ser território de múltiplas visões – e porque não – penetrações. Joana, por não ter percorrido a estrada que é o amor, não percebe porque é ele nunca a odiou, mesmo quando ela lhe pediu, o porquê de não a ter tentado matar, sabendo que acabaria por morrer primeiro. Continuou então, a morrer lentamente, agarrada às longas melodias dos companheiros de ambos, Everything but the Girl, aguardando sentar-se a seu lado. E continua a aguardar.


"My head is my house unless it rains" Everything but the girl

Wednesday, June 29, 2005

Segredo V

No silêncio da música, encontro-te arranhada, emaranhada nesses longos cabelos loiros que atraíram a minha existência, como uma traça que busca a luz, como uma criança perdida numa praia, como um gato que perdeu a noite.
Tu sempre foste a minha luz, luz incandescente, que acabaria por me cegar. Luz preciosa, vital, esmagadora, bela, que mais tarde me haveria de encaminhar para uma morte contínua e rápida.
Certa vez, tentei matar-te, consciente que seria levado primeiro do que tu. E mesmo enquanto te observo por entre estas paredes cheias de sonho e poeira, não há uma única parte de mim que te consiga realmente odiar.

“E és tu que me eleva
E és tu que és urgente
És tu a quem eu canto
És tu a chama que sempre mente”



Amar-te sempre foi como morrer lentamente, anunciadamente, perdidamente. E assim continuei a adormecer a teu lado, a cheirar o teu perfume evitando reconhecê-lo, ler os teus lábios mesmo sabendo que eram também eles que te denunciavam.. Ninguém, nunca, percebeu as razões do meu auto-deliceramento, como se o amor pudesse ser compreendido, como se algum de nós o quisesse compreender.
És fogo em mim, luz que evoca, carne que provoca. Quis ser teu e acabei por ser suor que desaparecera, monotonia que se arrastara, rotina que esmagou implacavelmente a nossa cumplicidade.
Diziam-me todos os teus passos, todos os teus sorrisos largados das nuvens, quantos quadros vendias e o preço que lhes estipulavas e ainda assim importei-me pouco. Queria-te assim, como diria Eugénio de Andrade, “cheia de doçura/sentada olhando as rosas/ e tão alheia/nem dás por mim.
Vejo-te então cheia de remorsos, a lutares contra a tua própria existência, a justificares a morte com o nada que é a tua alma.

“A alma é um vício”.

De início, não reparava como deixavas de tentar não acordar, quando fugias e desaparecias absorta nesse teu emprego que muitas vezes imploravas que cessasse, no qual te debatias com os múltiplos pseudo-intelectuais que te sobrecarregavam com extravagâncias dignas de uma diva de ópera italiana, sempre italiana. Em vez disso, passaste a saborear cada torrada como se fosse a última, mesmo quando ta serviam queimada, a olhar os empregados, que sempre te fizeram sentir um certo tédio, com alguma bondade. Tinhas finalmente percebido o teu lugar no grande panteão dos seres que não pertencem a esta nossa pequena perspectiva. E eu não me importei.
Quis-te minha e queria-te plena, por isso fechava os olhos e sonhava em agarrar-te nesses longos cabelos loiros e despir-te o fato preto que acabarias por deixar de usar, mais tarde, e acariciava-te os seios mesmo ali em cima da secretária, enquanto algum milionário me jurava que estaria sempre inocente a fim de me convencer a defende-lo, mesmo quando a própria justiça se encarrega desse fácil papel. E era sempre mais, entre frágeis mãos que muitas vezes não eram minhas. Antes de vir para a este sítio, onde dizem que estou morto, enquanto tu adormeces ao som da cidade que raramente se ouve, imaginava corpos a suar, o sexo de outro a roçar no teu, tu a sentires o prazer por entre paredes e molduras que ninguém desvendava e sempre uma mão a segurar o teu cabelo que me levara até ti, fonte da tua luz.
A verdade é que nunca quis morrer, mas nunca tentei sequer despistá-la. Permanecer a teu lado foi sempre tentar encontrar uma tradução sem fim para essa procura por uma satisfação, para as saudades que sentiria quando aqui me encontrasse.
Não te odeio. Estou apenas à tua espera.

For you, i´ll be your plastic toy - coldplay

Friday, May 20, 2005

Segredo IV

São luzes que se movem lá ao longe. Luzes que escondem os verdadeiros desejos de quem quer esquecer tudo aquilo que já viveu, lentamente, por entre ruídos que a transfiguram e silêncios abafados.
È no silêncio que tudo se passa.
Em que arranha a sua própria realidade e onde a sua existência se compadece de tanta dor, por entre sombras que nunca deixam de trespassar a sua contigência, entre quadros bucólicos, repletos de prazer que nunca mais alcançará.

Querer agarrar o tempo
voltar atrás por mais do que um momento
aprender a morrer lentamente
esquecer que se é mortal
e conter em si algo mais do que carnal.
Viver num segredo sem tradução
tremer, sem encontrar a razão.
Noite que liberta
um olhar que quer esconder
Não nos basta querer,
temos de ter.

Estende-se na cama. Enrola-se por entre os lençois brancos e tudo lhe regeressa - uma espécie de dor que a atinge, que a torna mais pequena, fugaz e impaciente, sangue que jorra e não pára, saltos e confusões planeadas, gritos e um sexo que a havia de levar ao centro de si própria- como se nada se tivesse passado.
Fecha os olhos, mas ainda sente o sabor nauseabundo e leve que disseca numa segurança intransigível. Agarra-se à cama e a toda a sua coma transparente. Agarra-se aos lençois que escondem a sua própria vergonha. Agarra-se ao segredo que a faz querer não adormecer, segredo que esconde por entre os olhares que afasta mesmo quando se olha ao espelho, para provar que, lentamente, se extingue. Ciclicamente.

"Lentamente o processo evoluí
como se o mundo parasse."

Antes de acordar, imagina que ainda é de noite e tem uma vaga probabilidade de se encontrar, quando nunca teve opurtunidade para tal. Porque é de noite que todos nos perdemos, inconscientes de que a noite não nos encobre, apenas nos torna mais distantes de uma perspectiva mais nula.
Antes de acordar, Joana espera não acordar sozinha, talvez que alguém lhe agarre a mão, esse alguém que durante um Tempo indeterminado rejeitou e agora espera, com toda a força que ianda lhe resta, que russuscite e volte para onde nunca deveria ter saído.

"Ela está a morrer
L e n t a m e n t e"

Olha-na como se se perdessem na sua imagem. Viram-na passar diante deles durante tantos anos, carregando molduras e obras nunca compráveis à arte que, deliciada, depositava em cada passo que pretendia dar. Suportando uma carga imposta por um mundo moderno que a comprimia e a saturava. Que a fazia transbordar um tédio constante e uma angûstia delicerante - que nunca haveria de ser o seu - deixando um cheiro de sexo e sensualidade que nunca haveriam de provar.
E sempre que ela aparecia do cimo das escadas, desenhada e limitada pelos seus longos caracois loiros, algum deles haveria de começar o dia de uma maneira mais agradável. São olhos azuis carregados de um brilho que nos reflecte a paz do mundo, que por não existir, nunca acreditamos na sua possibilidade.

"Dizem que quem muito fornica, acaba fornicado. Talvez seja isso."

São olhos que a seguiram e continuarão a seguir, com uma competência atroz, de quem não faz perguntas, mas que sabe perfeitamente que o fim está próximo.
Que vivem daquilo que ela lhes proporciona. como formigas que nunca conseguem sobreviver sem o seu pólo central e a segurar um desespero que passou a ser deles, também. Vestem trajes de gala, como se os longos serões os esperassem todos os dias, porque eles sabem, que o fim está próximo.
São olhos que chegam para quatro seres, de dimensões não similares, com "estórias" inscritas no panteão dos escravos do prazer pertencente ao mundo dos sonhos. São olhos que efectuam as suas tarefas como se nada tivesse ocorrido e uma morte fosse apenas o fim de alguém que não eles.
Separados criam as suas versões cinematográficas de uma realidade que não compreendem, colectivamente, desenvolvem a sua capacidade de interpretação em que imaginam a projecção dos gritos de prazer que se haveriam de tornar de dor, um pouco mais tarde. Não têm sexo, apenas funções porgramadas. Funções integrantes numa casa que já não suporta um silêncio. Uma casa que se desgasta e pede, também ela para morrer.


L E N T A M E N T E

"Aprisiona-se no silêncio de quem já teve tudo
Talvez viver nesta aglomeração, sem sequer procurar uma razão"

Ainda é de noite, afinal, quando Joana acorda. Sente-se tentada a morrer diante do seu próprio desespero. Precisa de algo que a faça reviver, ali mesmo naquele momento. Dirige-se então, para a cozinha, onde de imediato um dos seres que a serve e que diariamente a rodeia, lhe deita o seu habitual "Martini Bianco", sem gelo e sempre com limão. Joana acha que o limão funciona como uma sinédoque para a vida que diariamente levara, onde pensara que conseguiura transformar o que de azedo a tormentava em algo de uso para si própria. Esqueceu-se que é mortal. Esqueceu-se de si própria.

"Ela fugiu, fugiu de si própria"
Joana não percebe porque é que o ser não a olha nos olhos como sempre se sentiu fascinado a fazer. Não se questiona, dirige-se apenas para a varanda, onde pelo frio que levemente começa a sentir, constanta que está nua. Talvez sempre tenha estado.
Lá fora luzes imensas aguardam o fim sua missão. Joana percebe agora, tarde de mais, que deveria ter fugido, quando nunca lhe pediriam uma justificação, quando ninguém a questionaria, quando o seu segredo seria ainda capaz de ser sustentável apenas com a dureza de um silêncio.

" E ela já não sabe qual o lado acertado,
Apenas que está a fugir, outra vez"
Lá fora, o seu silêncio torna-se perceptível, onde a sua dor se torna audível. Por isso grita para que todos a oiçam, grita para que a segurem e a detenham, grita para não ser a única a perceber uma morte da qual foi directamente responsável e nunca teve a coragem ou discernimento para o admitir. Grita para que a vistam, façam amor com ela, lhe mostrem de quantas cores é feito o arco-íris. Grita por amor.
A Joana ainda não perdeu tudo.

"And i don´t know wich way is left,
So i hold my breath till the morning, till i see the light
I´m on the run, i´m on the run again, from me." N. Imbruglia, On the run.

Tuesday, April 26, 2005

O Segredo III

Ouve vozes, ouve ruídos que a marcam de uma forma esmagadora e simples. Houve alturas em que apenas ouvia a música que durante tempos a seguiu por entre um caminho que nunca esperou percorrer, mas que inevitavelmente gostou. Ouve, agora, vozes que a seguem por entre paredes habitadas, fantasmas que tal como ela sangram e esperam apenas uma opurtunidade para se livarem dela.
São corredores imensos de uma angûstia incontrolável, cobertos outrora por sangue, agora encobertos por um segredo. Segredo que a há-de matar. E já começou...

O Olhar esconde
A Palavra interrompe

Ela já não percebe qual o caminho a seguir, onde permanece o sonho que um dia quase segurou, nem porque é que as palavras lhe fogem, como se não lhe pertencessem. Não percebe porque é que o dia nunca mais esteve tão azul, azul como a alegria que vivera, como a vida que sustentara. Não percebe porque é que os olhos se fecham perante um estremecimento dão duro, tão forte. tão cáustico.
Quer livrar-se do segredo e surpreendemente não consegue. Este fardo é demasiado grande.
Grande como a casa que habita, Grande como o coração que já não precisa, porque já nada sente.
Grande como os monstros que aterrorizavam os velhos marinheiros, Grande como a tristeza que todos carregamos quando somos postos de lado.
Grande como os prédios que tentam alcançar o céu, ao invés de o tentaram refazer cá em baixo.
Este arrependimento delicera-a facilmente. É uma espécie de dor este falso esperar de algo que nunca virá, apenas porque já não existe. Por isso ela fecha os olhos, à espera de encontrar essa réstia de vida que ainda sustenta. À espera que tudo regresse e as mãos que outrora foram suas nunca mais desapareçam.

"Porque quem muito fornica, acaba fornicado"

Tornou-se apenas um parágrafo deste sistema. Os cabelos loiros que lhe caem no ombro são uma réstia de dignidade. Apenas ouve o que lhe referem da realidade lá fora. E ela espera, sentada, na cadeira, que a trasparência regresse, que o amor lhe devolva o que já teve, que esta vida fugidia não lhe escape. Dizem-lhe que se cuide, que se vista, que se lave. Dizem isto sem a olharem nos seus Grandes olhos azuis, porque sabem que ela reconheceria " a alma de quem nunca viu maior riqueza do que a que sentiu". E por isso a dor nunca a abandona, nem quando repete o segredo frente a gravuras que estão por toda a casa, que são as únicas faces em quem confia.

A palavra há-de nos levar
a um qualquer lugar
onde o olhar há-de esconder
quem nos quer amar.

De vez em quando, passeia livremente pelo jardim. Aí sente-se mais viva, mais presente e menos estranha a este mundo que muitas vezes nos atraiçoa. Passeia e desmaia de tantas recordações, de tanta passividade, de tanta melancolia. Pergunta-se para que precisa daquelas pessoas que a atormentam com perguntas infindáveis acerca da sua situação. Pessoas que lhe querem tudo, apenas porque já têm muito. Pessoas que a servem e que nem por isso lhe obedecem. Pessoas que aparecem e não voltam mais. Pessoas, pensa ela.
Há vezes em que se pica nas rosas que circundam todo aquele verde que apenas lhe trazem a solidão de volta. Há vezes em que sonha estar em frente à casa com que tantas vezes idealizou e acaba por se picar outra vez acabando por não repetir a saudade que sente, a espécie de dor que tanta a persegue. E por isso permanece em silêncio, concentrando-se. De quando a quando ainda ouve o seu nome, lá no fundo. E é sempre a mesma voz. De quando a quando pensa que é esse o seu destino, o porquê do seu caminho.

"Talvez viver nesta aglomeração
sem sequer procurar uma razão"
Quando entra de novo em casa, não vem sozinha. Olhos que a seguem, múrmurios que a percorrem, uma tristeza tão grande quanto a sua casa. Enquanto sobe as longas escadas, sente-se cansada e espera em Deus uma razão para não se deixar levar de uma forma inerte e fria.

Ela está a morrer.
Ela está perdida
Ela só queria viver.

Enterra-se levemente na cama onde já esteve acompanhada, mas que como tudo, lhe escapou, mesmo por entre um olhar e uma impotência amarga, que lhe deixou um nó intransigente, incapaz de a deixar encontrar uma tradução para o seu próprio silêncio.

"Fujo do meu segredo
como se dele tivesse medo
longe do mundo, longe das coisas
a ver se não me arrependo
Como se a vida se me extinguisse..."
A Joana está a morrer, por entre um céu mais azul, por entre um amor que já foi seu, por entre uma saudade que há-de voltar sempre. " E nem o tempo há-de chegar" para ela dizer o quanto esta espécie de dor a torna tão frágil, nem o tempo há-de matar a sua saudade e fazer com que reviva de uma forma mais límpida tudo que outrora rejeitou.
Há coisas que nunca serão nossas.


Morrer é ser iniciado. in Antologia Grega